19:08ZÉ DA SILVA

Tenho uma cabeça de Buda aqui na mesa. Ela é formada por plaquinhas transparentes. Dentro tem uma lâmpada amarela e um fio que sai dali. Dificilmente acendo a cabeça, mas hoje resolvi fazer isso e colocá-la na janela do escritório que dá de frente para a rua. Fiquei pensando merda, meu exercício favorito para depois escrever coisas teoricamente sérias – e esqueci o Buda. Quando me toquei tinha uma multidão concentrada no portão. As pessoas estavam em transe. Como eu sei? Desci lá e ninguém notou nem quando o motor do portão automático foi acionado. Olhavam na direção da cabeça – e ninguém piscava. Olhei também. Aí não vi a cabeça. Melhor, vi a cabeça e o resto do corpo flutuando. Tudo iluminado . Não conseguia mais me mexer, mas aquilo me deu uma paz nunca conseguida nem depois do gozo. Foi então que o caminhão do lixeiro passou com a algazarra de sempre. Não havia mais ninguém ali. Olhei de novo para a minha janela. A cabeça estava lá, mas apagada. Subi, tirei a lâmpada de dentro. Tinha queimado.

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