9:24Em Curitiba, ‘Rei do bitcoin’ tem os bens penhorados

Do jornal Valor Investe

‘Rei do bitcoin’ tem bens pessoais penhorados

Após planos ambiciosos de ter moeda própria, dono do GBB é alvo de ações judiciais

Claudio Oliveira, dono do Grupo Bitcoin Banco (GBB), sonhava ter a maior plataforma de negociação de criptoativos do mundo e a própria moeda, a Br2Ex, mas na sexta-feira, na sua residência em Curitiba, viu não só os planos quase irem embora, como também os estimados sapatos Louboutin seus e da esposa, Lucinara Oliveira.

O dono do GBB foi alvo de ação de sequestro de bens, que alcançou sua casa e sua chácara, devido a uma decisão obtida no judiciário pelo advogado Gustavo Bonini Guedes, em busca de obras de arte, quadros, relógios e joias. Os oficiais de Justiça estavam prontos para levar o que encontrassem de valor, inclusive os calçados da refinada grife francesa. Como o Valor Investe apurou, eles chegaram a ser empacotados, mas não foram removidos da casa após nova promessa de quitação dos débitos nesta segunda-feira.

Procurado, Guedes, que representa clientes com R$ 13 milhões a receber e que aguardam cumprimento de um acordo já firmado, não quis comentar o assunto.

A ação judicial — que terminou na penhora dos bens, mas sem a retirada — agitou grupos de clientes nos aplicativos WhatsApp e Telegram e alimentou rumores de que Oliveira poderia estar de viagem marcada à Suíça.

A movimentação dos oficiais levou clientes que acompanham os passos do empresário de perto a gravar áudios que se espalharam no fim da noite de sexta, alertando para a eventual mudança. Consultada sobre a possibilidade de Oliveira deixar o Brasil, a assessoria do GBB respondeu que ele não iria comentar.

O valor que o caso envolve é desconhecido. Tudo indica que as cobranças somam centenas de milhões, conforme clientes ouvidos, mas eles não duvidam que o total possa beirar a casa do bilhão. O cálculo é difícil, uma vez que Oliveira se nega a fornecer detalhes — inclusive aos credores. No domingo, o empresário falou brevemente com o Valor Investe e disse que, em breve, detalhará em entrevista qual será a saída para essa crise, que se diz empenhado em resolver.

Entre março e maio de 2019, ele foi assíduo frequentador de colunas sociais com festas e jantares promovidos em São Paulo e Curitiba. Numa dessas, com cobertura do apresentador Amaury Júnior, passou a ser chamado de “o rei do bitcoin” e, em entrevista, disse ter feito receita superior a R$ 180 milhões só em março com as taxas cobradas das movimentações no grupo. À época, dizia que a NegocieCoins tinha o maior volume transacionado do mundo, chegando a US$ 900 milhões ao dia em abril.

Os clientes foram atraídos ao GBB pela perspectiva de lucro e pelos produtos que trocavam o depósito do bitcoin por rentabilidade, sem custo — oferta cada vez mais comum no segmento, embora muitas vezes irregular. Com duas corretoras de criptomoedas próprias, eles tinham ganho assegurado alternando posição entre a NegocieCoins e a TemBTC, pois o GBB, como “market maker” (provedor de liquidez), sustentava uma diferença de preço contínua que permitia arbitragem permanente nas cotações, de acordo com fontes.

A oportunidade tornou-se chamariz para investidores, dos mais aos menos experientes em criptos. Uma enquete com 195 participantes em um dos grupos de WhatsApp apontou que 80% dos membros investiu menos de R$ 300 mil.

Tudo ganhou proporções maiores em fevereiro, quando Oliveira anunciou o sistema que batizou de FortKnox — mesmo nome da localidade nem Kentucky, nos Estados Unidos, conhecida por abrigar o ouro daquele país.

O sistema foi desenvolvido para ser uma espécie de carteira para arbitragem de criptos, conforme pessoas que viram de perto sua criação. Os clientes colocavam bitcoins e recebiam um código, algo semelhante à cota de um fundo no mundo dos ativos regulados. A partir daí, perdiam a visibilidade de suas criptomoedas individualmente e tudo que viam era o valor equivalente ao que colocaram ser multiplicado em grande velocidade. Com satisfação, ampliavam os aportes.

Foi assim que Oliveira declarou a explosão nos volumes. A verificação dos montantes, porém, é quase impossível, pois a rede é propriedade do GBB.

No fim de maio, os usuários começaram a enfrentar os primeiros problemas para saques, com lentidão e tentativas frustradas. Nessa época, Oliveira anunciou ter sido alvo de uma fraude que teria subtraído R$ 50 milhões em duplicação de saques. A retirada, então, foi formalmente bloqueada pelo próprio GBB e, desde então, não foi normalizada. Enquanto isso, o Brasil Plural, banco que hospedava a conta corrente das plataformas, cancelou o contrato sob alegação de não ter conseguido satisfazer demandas de controles internos.

Das narrativas de sucesso às promessas de solução para a crise

 

O temor de que Oliveira esteja de mudança para a Suíça se deve à história que o próprio contava aos mais próximos. Sempre ostentando marcas de luxo e voando em aeronaves particulares, ele se apresentava como um clássico “self made man”. Aos 48 anos e nascido em Anápolis (GO), gostava de narrar que saiu do Brasil aos 17 anos após ganhar bolsa em uma universidade na Suíça, onde dizia ter obtido duas graduações, “engenharia elétrica” e “engenharia financeira”, além da cidadania. Morou no país europeu até 2012, onde, além de doutorado, também em “engenharia financeira”, contava ter feito fortuna (de valor desconhecido) com criações na área eletrônica e em outros segmentos. O Valor Investe solicitou o currículo do empresário, mas não obteve retorno.

Após uma tentativa de voltar ao Brasil, interrompida por um sequestro, o empresário optou por ficar nos EUA, onde diz ter vivido até 2017, quando retornou decidido a empreender na área industrial. O projeto foi largado quando conheceu o mundo das bitcoins e, numa súbita guinada, optou por abrir o GBB. Ao longo de 2018, comprou as plataformas.

Mas, desde que os problemas com os saques começaram, as narrativas sobre sucesso foram substituídas por promessas que, uma após a outra, foram descumpridas. No início de junho, sem a conta no Brasil Plural, disse que adquiriu, como pessoa física, uma companhia de “arranjo de pagamentos”, sem dar o nome e sem que gerasse solução.

 

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