11:50Leonard Cohen, adeus

do jornal O Globo

Aos 82 anos, morre o cantor e escritor Leonard Cohen

Corpo do compositor de ‘Hallelujah’ será velado em Los Angeles

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O cantor, compositor e escritor canadense Leonard Cohen morreu na noite desta quinta-feira aos 82 anos, de acordo com informações de sua página oficial no Facebook. A causa da morte ainda não foi revelada. “É com profunda tristeza que reportamos que o lendário poeta, compositor e artista Leonard Cohen morreu. Nós perdemos um dos visionários mais prolíficos e reverenciados da música. Um memorial será realizado em Los Angeles em uma data próxima. A família pede privacidade durante seu momento de dor”, diz o comunicado.

Mais conhecido como autor de “Hallelujah”, uma das músicas mais regravadas da história, Cohen influenciou uma imensa geração de cantores-compositores. Em outubro desse ano, o canadense havia lançado “You want it darker”, seu 14º e último disco. Na coletiva de lançamento do disco, Cohen brincou e disse que pretendia viver até os 120 anos, mas em outras entrevistas recentes afirmou que estava perto da morte e que sentia dores.

Leonard Norman Cohen foi um improvável artista do rock. Conheceu o gênero já aos 32 anos, quando era comum ser adulto a tal altura. Tinha quatro livros publicados e uma carreira reconhecida como poeta.

Mas o garoto de Westmount, em Montreal, filho de proeminente família judaica, nunca teve qualquer traço de rancor ou rebeldia — “eu nasci de terno”, dizia ele, como recorda Sylvie Simmons na biografia “I’m Your Man”. Sempre gostou de estar em evidência nos seus círculos sociais, de se vestir bem e de cantar para as mulheres: logo, nada melhor que abraçar a possibilidade de dar sonhos ao mundo, prazer a si mesmo e cortesia às senhoritas.

Era 1966, era época dos primeiros festivais que mudaram o mundo, era a época de Bob Dylan, e se tornaria também a época de Leonard Cohen, que, diferentemente do seu principal competidor, jamais viu necessidade de disfarçar num pseudônimo as origens judaicas.

Foram elas que lhe deram seu principal hit, “Hallelujah” (de “Various positions”, 1984), regravado por inúmeras vozes até se tornar peça de resistência em realities como “The Voice”: ao recriar a cobiça do rei-harpista Davi ao espiar a casada Betsabá, Cohen uniu o sacro e o profano numa substância única, de tal forma que tanto religiosos quanto amantes em estado de ebulição se deixam impressionar em uníssono. Sua música podia ser um ritmo klezmer de judeu ashkenazi, podia ser uma valsa, podia ser uma balada, ou a mescla de timbres primitivamente eletrônicos com que embalava “First we take Manhattan, then we take Berlin”, em 1988.

Essa habilidade de transformar simbologias religiosas em metáforas de paixão foram seu principal trunfo, e lhe renderiam um repertório que influenciaria diretamente gente tão diferente quanto o grunge Kurt Cobain, o barroco Nick Cave e o operístico Rufus Wainwright, entre outros.

E obviamente, havia a voz: primeiro algo imaturamente leve, como se pode ouvir nos primeiros discos e no registro ao vivo na Ilha de Wight-1970: foi assim que registrou a balada “Marianne”, de seu álbum de estreia prosaicamente batizado “Songs of Leonard Cohen”, de 1967. Marianne fora sua primeira musa nas canções, e era de quem se despedia prometendo sorrir algum outro dia no refrão. Tal doçura também existia no sincero arrependimento que demonstrava por ter admitido um dia que “Chelsea Hotel #2” (de “New Skin for Old Ceremony”, de 1974), uma ode ao sexo descomplicado, tinha sido inspirada numa noite com Janis Joplin. “Uma revelação deselegante”, comentaria ele depois.

Sua voz ganhou gradativa profundeza, tornando-se nos anos 1980 um baixo-barítono quente e áspero, com graves lúgubres à primeira audição, mas que na verdade intencionavam se aproximar de uma declamação cálida, em que inúmeros versos imploravam por nudez, como se o sexo fosse a única transcendência possível, como em “Ain’t No Cure For Love”. A sonoridade se encaixava perfeitamente com o ar de veterano, os cabelos grisalhos, uma espécie de Dustin Hoffman envelhecido, um profeta gentil e doce, vindo de outras eras para transformar rock em literatura.

Não era um compositor exatamente prolífico. Admitiu diversas vezes que suas composições eram rascunhadas por meses e às vezes anos, com cuidado e rigor, o que o levou a pérolas como “Dance me to the end of love”, “Anthem” e “Tower of Song”. Mas também por isso experimentou longos hiatos nos 50 anos de sua carreira, de onde saem apenas 14 discos.

 

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