Abri a geladeira e eles estavam lá. Pés de galinha. Muitos. A dona da casa adora-os.
Da janela da cozinha dá para ver os futuros que ali estarão – cozidos, bem temperados – prontos para serem chupados. Pois é assim que ela faz à mesa, segurando-os com a mão, lambuzando o entorno da boca. Os olhos brilham de satisfação. Olhei bem para ela. Idade avançada, mas com uma energia absurda. Viúva. Criou a filha, o neto  e outras crianças que adotou. Cuida da plantação e do gado. Nunca saiu daquele pedaço de chão. Aguentou seca e dilúvios. Só não a incomodem. É dura na queda. Certa vez tentaram entrar na casa construída à beira de uma estradinha e distante das outras naquele fim de sertão. Os buracos das balas que disparou na porta deram o recado definitivo. Ela tem um 38 sempre à mão. Perguntou se eu queria dar uns tiros. Eu disse que não. Mas pedi para experimentar um daqueles pés de galinha.