7:09Destros e canhoteiros

por Célio Heitor Guimarães

Essa coisa de direita e esquerda é tão antiga e fora de moda quanto as camisas Volta ao Mundo, as calças de tergal e o jipe Rural Willys. Por isso, surpreende-me que a atual disputa pelo poder em Brasília esteja sendo identificada como um embate entre direitistas e esquerdistas, inclusive por cabeças qualificadas da inteligência nacional.

Então, combater a corrupção, os desmandos, a incompetência e a falta de rumo do atual governo federal é ser de direita?! Por outro lado, lutar pela manutenção do atual estado de coisas, defender o mar de lama que afoga a administração pública, a “presidenta” e seu guru barbudo é ser de esquerda?!

Ora, convenhamos. Poucas vezes se ouviu tamanha besteira.

Nunca houve, na verdade, um consenso sobre o que é ser de direita ou de esquerda. E não será agora, em meio a atual crise, impregnada de contradições, más intenções e galhofa, que se chegará a uma conclusão.

Aliás, identificar a dona de casa, o comerciário, a balconista, a professora, o funcionário público ou o advogado, médico e fisioterapeuta, que saem às ruas, em manifestações pacíficas e distanciadas de partidos políticos e organizações sociais de “perigosos agentes da direita” é mais do que uma pilhéria. É debochar do bom senso. Tanto quanto identificar Dilma, Lula, Mercadante, Rui Falcão, José Guimarães, Jacques Wagner, Delúbio Soares, Vaccari Neto, Lindberg Farias e o comunista do Brasil Orlando Silva com “militantes da esquerda”, preocupados com as desigualdades sociais e econômicas.

Os grandes representantes da direita deste país, da elite dominante – todos amigos e financiadores de Lula & Cia, – jazem hoje nas masmorras do juiz Moro; e os autênticos esquerdistas do PT, como Hélio Bicudo, fundador do partido e que firmou o pedido de impeachment da “presidenta”, estão do outro lado da trincheira ou amargam, no recesso dos seus lares, o rumo que a sigla tomou, como Olívio Dutra, Tasso Genro, Fernando Gabeira e Cezinha Benjamin.

Lula, o grande líder do Brasil, nunca foi de esquerda, Lula nunca teve ideologia – sua ideologia era ditada, para efeitos da plateia, por José Dirceu e, talvez, José Genoíno. Lula sempre teve, e só, sede de poder. E, com sua lábia afinada nos movimentos sindicais do ABC, enganou a todos nós.

O sociólogo César Benjamin – como foi aqui relatado, semanas atrás, pelo nosso Ivan Schmidt –, depois de 16 anos de militância, das torturas nos porões da ditadura militar e de um exílio na Suécia, resolveu deixar o PT. Contou ao jornalista e escritor Zuenir Ventura, sem esconder uma ponta de ironia: “Quando comecei a ver gente lombrosiana ganhando cada vez mais importância, procurei o Lula, e ele disse para eu não me meter”.

Iniciei este texto falando sério, mas cansei. O tema não merece. Esse negócio de direita e esquerda não passa de uma farsa. Nasceu durante a Revolução Francesa e servia tão somente para indicar o lugar onde os políticos sentavam no parlamento francês – à direita ou à esquerda da cadeira do presidente parlamentar.

Mas aí entraram no jogo os “pensadores”, como Saint-Simon, Karl Marx, Engel, Lênin, Thomas Paine, Rémond, Adam Smith, John Locke, Goeth, Irving Babbitt e, mais recentemente, Brizola, Arraes, os irmãos Castro, Hugo Chaves, Nelson Rodrigues, Garrastazu Médici, Geisel, Ronald Reagan, George Bush e Jair Bolsonaro e embolaram o meio de campo. Deu no que deu. O povo, protegido, está cada vez mais miserável, e o rico, desamparado, cada vez mais rico. Sob a batuta da ditadura militar, de José Sarney, de Collor, de FHC, de Lula ou de Dilma. O único que ofereceu benefício real (sem trocadilho) à população foi Itamar. Mas este não é levado a sério.

Quando eu era criança e ouvia falar de esquerdista e direitista, pensava imediatamente tratarem-se de pessoas canhoteiras e destras. Tinha até os meus ídolos pessoais: Garrincha, Jairzinho, Rivelino, Pepe e Pelé, que chutava com as duas.

Acho que vou continuar pensando assim.

 

 

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2 ideias sobre “Destros e canhoteiros

  1. ferreira

    Eu penso assim:
    Se é direita é direito, outros não.
    Da direita têm obrigações, da esquerda locupletações.

  2. Ivan Schmidt

    Celio Heitor é sempre um pensador que corresponde aos anseios de seus leitores, entre os quais me incluo com muita honra. Sua análise do contexto político brasileiro é produto de uma lucidez restrita aos que sabem o que dizem (ou escrevem) e, acima de tudo, ainda explicam porque…

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