… As gravações do maior líder da esquerda brasileira expõem, além dele, a presidente, ministros, políticos, juízes do Supremo, instituições e o sistema político brasileiro como nunca antes na história do país. Cada áudio é um escândalo. Quem é contra esse tipo de exposição prefere manter Brasília operando na sombra, como apontou o juiz Sergio Moro ao explicar sua decisão de dar publicidade legal às conversas nada republicanas. Republicano é divulgá-las.

E o que veio à tona não pode ser explicado sem ser confessado. Por isso, o governo sequer tenta, de fato, se explicar. Como sempre, esquece o mérito e prefere atacar o juiz, a investigação e a massa que os apoia. Mas a agressividade cínica que serviu ao PT para intimidar adversários hoje serve de combustível aos protestos.

por Sergio Malbergier, na Folha de S.Paulo

Encurralado e encastelado, o PT não consegue mais ler o Brasil.

Horas depois do protesto mais contundente da população brasileira contra seus governantes, o governo comandado por Lula e Dilma ignorou totalmente o recado e foi para cima da população e da Lava Jato. Cinco dias depois, a população e a Lava Jato estão na porta de Dilma em Brasília e de Lula em São Bernardo, muito mais fortes.

O PT achava que Lula salvaria o governo, mas hoje ele parece mais o seu coveiro. Com seu rico vocabulário, Lula disse que a cabeça da jararaca estava intacta e pronta para atacar. Mas foi a cabeça da jararaca que foi atacada. Lula disse que era o único que podia incendiar o país. E ele de fato incendiou, mas contra ele.

As gravações do maior líder da esquerda brasileira expõem, além dele, a presidente, ministros, políticos, juízes do Supremo, instituições e o sistema político brasileiro como nunca antes na história do país. Cada áudio é um escândalo. Quem é contra esse tipo de exposição prefere manter Brasília operando na sombra, como apontou o juiz Sergio Moro ao explicar sua decisão de dar publicidade legal às conversas nada republicanas. Republicano é divulgá-las.

E o que veio à tona não pode ser explicado sem ser confessado. Por isso, o governo sequer tenta, de fato, se explicar. Como sempre, esquece o mérito e prefere atacar o juiz, a investigação e a massa que os apoia. Mas a agressividade cínica que serviu ao PT para intimidar adversários hoje serve de combustível aos protestos.

A revolta de março é a evolução natural das manifestações de junho de 2013. Enquanto os políticos ignoraram o alerta, a Lava Jato trouxe concretude às reivindicações populares por dignidade política e serviços públicos eficientes, combatendo pela primeira vez de forma efetiva um sistema político desde sempre corrupto e refratário que impede o desenvolvimento do país.

A esquerda perdeu as ruas. A revolta de março replica no Brasil, pela centro-direita, os movimentos de rua modernos tipo “occupy”. A capacidade de mobilização hoje é enorme, desde que haja motivação. E motivação não falta.

Uma das grandes realizações desses 13 anos de PT foi despertar politicamente a elite brasileira, que, desde a injuriosa campanha presidencial de 2014, saiu de sua vida murada para dar vida às ruas com reivindicações que são as mesmas da grande maioria da população —governos dignos e eficientes. O PT e as esquerdas em geral cometem erro enorme ao subestimar e provocar essas elites. Todas as pesquisas de opinião mostram que patrões e trabalhadores pensam muito parecido em relação ao governo Dilma-Lula— não só o reprovam como querem sua destituição.

No mês mais excitante de nossas vidas políticas, os acontecimentos se sucedem com choque e pavor, força e frescor.

O Antigo Regime treme. O povo cerca os Poderes e os poderosos. O gigante novamente acordou. Ninguém dorme.