7:22Calor ou ar condicionado

por Mario Sergio Conti

Além de salto triplo carpado, sem rede de proteção, Lula aceitar ser ministro implica rendição. Depois de detido e interrogado, ele disse que percorreria o Brasil. Conclamaria o povo a se defender, a defendê-lo, e ao governo de Dilma. Não poderia mais fazer isso.

Teria que aposentar oratória elétrica, em benefício de tertúlias com raposas sibilinas, da negociação de cargos e sinecuras. Entabularia um toma-lá-da-cá sem fim. Em vez do calor das ruas, frequentaria gabinetes com ar condicionado.

O potencial de conflitos com Dilma seria permanente. Resultaria um governo de tensão continuada, cujo norte só pode ser um: a conciliação, estratagema no qual os trabalhadores costumam sair perdendo. Lula se livraria de uma eventual prisão em Curitiba. Marisa e seus filhos, não.

Dilma, por sua vez, não se livrará das delações premiadas. Como a de Otávio Marques de Azevedo, presidente da Andrade Gutierrez, preso em junho passado. Engenheiro com carreira na área pública, ele é um mineiro capaz de encher a sala com palavras, mas prefere assuntar.

Os colegas achavam que, dado o seu alto astral, resistiria à pressão para fazer a delação premiada. Cadeia é fácil para quem nunca foi em cana. Os dias passaram, viraram meses, que se repetiriam até onde a vista alcança. Azevedo entrou em tratativas com a Lava Jato.

Na semana passada, ele depôs à Procuradoria-Geral da República. O depoimento está em segredo de Justiça até ser homologado pelo juiz Teori Zavascki, do Supremo. Isso deve se dar em meados de abril, o mais cruel dos meses.

Azevedo disse à Procuradoria que o ministro Edinho Silva e Giles Azevedo, factótum de Dilma, lhe pediram que a Andrade Gutierrez fizesse doações à campanha de reeleição da presidente. Ricardo Pessoa, dono da UTC, adotou atitude parecida. Léo Pinheiro, ex-presidente da OAS, deverá falar a mesma coisa.

O PT, o PMDB e partidecos serão implicados pelos depoimentos. Os tucanos, não. Mas importa menos que Aécio Neves e Geraldo Alckmin tenham sido escorraçados da avenida Paulista: a articulação junto ao Tribunal Superior Eleitoral para tirar Dilma do Planalto receberá um empuxo decisivo.

A destituição da presidente poderá ser feita na Câmara, antes até de o caso chegar ao TSE, com Lula no governo ou não. Quem dá as cartas lá é o pântano, conhecido como PMDB. Sob o comando pândego de Eduardo Cunha e Renan Calheiros, o partido avisou no sábado que abandonaria o navio se as manifestações do dia seguinte ribombassem, o que ocorreu de sobra.

Entre a rua Augusta e a Haddock Lobo, tiozinhos barrigudos, com latas de cerveja na mão, puxavam o coro: “Lula cachaceiro/devolve o meu dinheiro!”. Todos os seguiram. Nem o general João Figueiredo, há 31 anos, foi enxovalhado assim no ato pelas Diretas no Anhangabaú.

Para acordar sua base, o PT marcou comícios. Como nem os crentes acreditam que atrairá multidões, a pressão para Lula entrar no governo prosperou. O partido nada fez para organizar os trabalhadores nos últimos anos. Difícil que o faça agora, quando o desemprego grassa.

A manifestação na Paulista lembrou o entorno do ato no Anhangabaú. Há ruína material, miséria dos serviços públicos, ratazanas que dão piruetas e caem incólumes em outra nau, à cata de nacos em negociatas vindouras. A novidade é que a esquerda está prostrada.

*Publicado na Folha de S.Paulo

Compartilhe

Uma ideia sobre “Calor ou ar condicionado

  1. Sergio Silvestre

    Os abutres não querem o Lula como ministro até para ficar pentelhando ele até 2018.
    Eu acho que deve sim aceitar,tirar ele das mãos do tucano Moro e deixar ele fazer o que gosta que é politica.
    Depois vamos ver se os supostos isso,supostos aquilo é verdade,por que querer condenar o homem por suposição,só esse Moro mesmo né.

Deixe uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.