16:37O SILÊNCIO DO PARAÍSO

por José Maria Correia

De minha janela sobre a rua deserta curto o raro privilégio.
Ouvir o silêncio do mundo, como era antes da criação.
Que é rompido apenas pelo vento balançando as folhas das árvores e o canto dos passarinhos em plena paz.
O poeta Vinicius dizia em seus versos : Bom mesmo é não fazer absolutamente nada.
Agora chamam de Nadismo.
Que mais posso desejar ?
Estou em plena harmonia com o Universo, com os elementos da natureza.
Ao meu lado os gatos, sobreviventes das ruas, lagarteiam felizes ao sol como eu, enquanto a vida segue mansamente como nos jardins do paraíso perdido.
Ao longe, distante, há o rumor do mar em minha memória e páginas do álbum do passado vão virando.
As vozes dos pais me chamando se confundem com o vento e o tempo.
Os sinos da missa de domingo dobrando gravemente, o longo apito melancólico do trem na madrugada, a lenha crepitando no fogão da cozinha, o disco de Ray Connif na radiolinha de pilha.
São os ecos perdidos .
Os que só o silêncio traz, aquele que habita o mais recôndito espaço de nosso interior, de nossa alma.
Onde temos o grande baú secreto de tesouros da vida.
As jóias da infância como relicários das pequenas alegrias ingênuas, das paixões adolescentes e dos amores românticos.
As ilusões do doce pássaro da juventude que voou com suas asas esplendorosas e desapareceu na linha do horizonte para não retornar jamais.
A arca sagrada do grande reencontro.
Onde guardamos as luzes do nosso existir e cuja chave será sempre a esperança , guardiã da memória e da sensibilidade.
Para todo o sempre e o nunca mais.

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