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por Ruy Castro

Em “My Fair Lady”, o musical da Broadway e de Hollywood baseado na peça “Pigmalião”, de Bernard Shaw, o professor Higgins prepara-se para apresentar aos esnobes de Londres a florista Eliza, que ele recolheu das ruas e ensinou a se expressar. Para que ela não cometa gafes, ele a instrui a só falar do tempo. Mais para o fim da peça, Higgins está desesperado porque Eliza o abandonou. Para que ele não dê vexame diante dos mesmos esnobes, sua mãe, a Sra. Higgins, aconselha-o a também limitar-se ao tempo.

Pelo visto, para Shaw, falar do tempo –se vai chover ou não, onde e quando, e a quantas vai ou não vai a temperatura– é a maneira mais segura de não dizer nada e não se comprometer. Por algum motivo, é também o assunto favorito das nossas emissoras de rádio e TV. O espaço que seus jornais dedicam a ele deixa longe o da política e da economia, só perdendo, talvez, para as notícias sobre crimes.

Discordo de Shaw. Acho fascinante a autoridade com que as moças do tempo discorrem sobre a formação de frentes frias, o ar seco e a velocidade do vento. Na televisão, fazem isso diante de um painel que, segundo sei, não está ali de verdade. Como conseguem falar andando, de salto alto, e apontar com tanta precisão para esta ou aquela região com a chuvinha ou o solzinho desenhado?

Moro no Rio e, ao ser acordado diariamente pelo rádio, adoro ser informado da umidade relativa do ar em Roraima ou da possibilidade de pancadas na ilha de Marajó –para saber se vai dar praia, chego à janela. E, ao tomar um táxi no Leblon, sob uma lua de 40 graus, é refrescante saber, pelo rádio do carro, que a máxima prevista para São Paulo nos próximos dias é de 25.

Durante milênios, a grande indagação do homem foi “quem sou, de onde vim, para onde vou?”. Não mais. Agora é: “Levo ou não o guarda-chuva?”

*Publicado na Folha de S.Paulo

 

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