7:28Mais que uma carta

por Janio de Freitas

carta aberta em que 104 advogados, juristas e professores expressam “repúdio ao regime de supressão episódica de direitos e garantias” na Lava Jato, configurando uma situação de risco para a Justiça brasileira, tem um problema insolúvel pelos signatários: para não ser dada como mera queixa de advogados, o que alguns acusadores logo fizeram, precisaria dar exemplo de cada tipo de impropriedade mencionado. O que talvez nem fosse difícil, mas exigiria espaço imensamente maior do que a meia página de “informe publicitário” que o simples relato exigiu. E a tarefa era também da chamada mídia, no entanto incluída pelos signatários nos procedimentos que ferem os direitos e garantias, sem falar na ética, e perturbam a Justiça.

A carta dos advogados segue-se a recente pronunciamento no mesmo sentido, mas diferente na forma, de uma corrente de juízes. Também não personaliza as denúncias. Apesar disso, toda a leitura leva aos integrantes da Lava Jato.

Mais que à própria Lava Jato, porém, a mensagem importa para o Conselho Nacional de Justiça, em particular ao seu presidente, Ricardo Lewandowski, e ao ministro Teori Zavascki, relator no Supremo Tribunal Federal das denúncias e delações premiadas procedentes da Lava Jato. Sergio Moro e os demais ativistas do caso já receberam numerosas observações sobre excessos seus e, com o evidente e até declarado sentimento de messianismo, desprezaram-nas. Lewandowski e Zavascki são, no caso, os guardiães do Estado de Direito, das normas que a todos nos protegem das arbitrariedades e prepotências dadas como extintas com o fim da ditadura.

Aos dois, sobretudo, diz respeito a carta aberta dos 104. A ambos cabe verificar, estudar, auscultar –e deter as impropriedades que acaso identifiquem. Antes que comecem a expandir-se.

OS AGRESSORES

Um grupo da comunidade judaica passou a semana em campanha contra mim. Suas mensagens ao Painel do Leitor, à direção da Folha e na internet têm as mesmas acusações infamantes e até as mesmas palavras e frases, a indicar o procedimento orientado. Atribuem-me intenção que nunca tive e insinuações e afirmações que não fiz.

Em segunda nota da coluna “A mensagem do quebra-quebra” (Folha, 10.jan, pág. A6), comentei, fundado em fatos, a tentativa do primeiro-ministro Netanyahu de impor ao Brasil um embaixador, Dani Dayan. Sem fazer a consulta de praxe ao governo brasileiro, divulgando-a antes de tudo na internet, e escolhendo um dos chefes de invasões e construções de bairros israelenses em terras palestinas. O que contraria a resolução da ONU que criou Israel, a posição do Brasil desde então e já foi várias vezes condenado pela mesma ONU.

O Netanyahu que assim age não tem a maioria em Israel. Para ser primeiro-ministro, alia-se ao fundamentalismo religioso, à custa de concessões que tornam mais extremista o seu e o radicalismo direitista do seu partido. A concepção democrática é da oposição. Há um ano e meio, o governo de Netanyahu repete atitudes insultuosas ao Brasil, dizendo-o “anão diplomático”, “politicamente irrelevante”, cuja presidente “fugiu” dele, Netanyahu, na COP-Paris. Na escalada, a pretendida imposição de um embaixador indesejado.

Assim terminava a nota: “O convívio cordial que é dado aqui à comunidade judaica não faria prever os insultos e provocações que Israel vem dirigindo ao Brasil. Essa comunidade tem os seus extremistas. Será melhor, para todos, que eles sejam contidos e não importem o espírito de Netanyahu. Os ânimos no Brasil não estão para riscos desse tipo”. Nada do que citei foi contestado pelos agressores.

Mas a leitura falseada do último parágrafo serviu para a campanha: fui acusado de escrever uma “ameaça à comunidade judaica”, por “ódio a Israel” e “aos judeus”, de publicar “atitude intimidatória com a comunidade judaica”, por ser “abertamente antissemita”, de fazer incitação, e daí por diante em linguagens iradas e violentas.

Volto ao não embaixador Dani Dayan: “O Brasil vai ter represália”. Sou eu quem ameaça? As mensagens incitam a comunidade judaica contra mim. Sou eu quem ameaça?

Não é inteligente supor que eu tivesse a presunção de ameaçar uma comunidade, étnica ou religiosa: é ridículo. Mas é também uma falsidade e uma forma de agressão. No país em que calúnia, difamação e injúria estão qualificadas no Direito Criminal e constam do Código Penal.

*Publicado na Folha de S.Paulo

Compartilhe

2 ideias sobre “Mais que uma carta

  1. Sergio Silvestre

    Acho que o sentimento da maioria do povo judeu que está espalhados como corintianos pelo mundo não reflete o que pensa seus governantes que gostam de jogar bombas aletoriamente em todo mundo e me parece serem inatacáveis.
    Os milhões de inocentes que morreram no holocausto não pediram a esses imbecis de passarem o resto de seus dias pagando na mesma moeda matando outros inocentes.

  2. John Doe

    O grande problema de povos e raças que se sentem permanentemente “perseguidos e injustiçados” é sempre igual. O primeiro-ministro israelense errou sim, e muito feio. Querer pretender enfiar goela abaixo do povo e do governo brasileiros é um absurdo, vai contra toda a lógica e as regras que regem as relações diplomáticas em vigor. Cabe ao governo israelense se quiser sair desta fria em que se meteu, por burrice e teimosia, baixar a crista, ou deixar estar com está indefinidamente. Qual vai das duas vai ser? O Netanyahu que escolha.

Deixe uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.