por Zé da Silva

Nasci embaixo de uma tenda nas Arábias, mas fui feito numa rede no interior do Nordeste brasileiro. Como com a mão direita, mas sempre com farinha para dar a liga. Ninguém entende, mas não reclamam. Só olham, sem encarar, porque sou poderoso. O poderoso quem? Imaginam que eu tenha muito dinheiro – e tenho mesmo! É minha proteção contra olhares preconceituosos. Sou negro e tenho cabeça gorda. Entro em qualquer restaurante onde a maioria come como se estivesse sentada num toco. Aprenderam tudo em família ou em cursos de etiqueta. Rio por dentro. Para fazer a liga, feijão e arroz são fundamentais. Peço em qualquer lugar do mundo. Sempre dão um jeito de achar – e rápido. Imagino porque às vezes estou lado de algum poderoso local ou artista. Sim, já aconteceu de o local não ter a farinha, não a industrializada, mas aquela que é feita com lenha queimando embaixo da grande superfície onde a mandioca moída na prensa passa pelo processo de espalhamento até secar. Não tem problema. Levo meu estoque particular, sempre aos cuidados de uma pessoa de confiança. Aprendi isso com meu amigo Frank Sinatra, que Deus o tenha, que carregava uma funcionária só para cuidar das perucas dele. Assim é, mas só para quem pode.