18:25Em nome da democracia

por Janio de Freitas

“Isso é democracia”. Não é, não. Um dos componentes essenciais e inflexíveis da democracia é o respeito às regras que a instituem. As regras existem no Brasil, precisas e claras na Constituição, mas o respeito é negado onde e por quem mais deveria fortalecê-las. O que está sob ataque não é mandato algum, são as regras da democracia e, portanto, a própria democracia que se vinha construindo.

Não há disfarce capaz de encobrir o propósito difundido por falsos democratas instalados no Congresso e em meios de comunicação: reverter a decisão eleitoral para a Presidência sem respeitar as exigências e regras para tanto fixadas pela Constituição e pela democracia. Há mais de nove meses, a cada dia surge novo pretexto em busca de uma brecha –no Congresso, em um dos diferentes tribunais, nas ruas– na qual enfim prospere o intuito de derrubar o resultado eleitoral.

O regime democrático é tratado na Constituição como “cláusula pétrea”, que se pretende com solidez granítica. O que não significa ser impossível transgredi-lo. Mas significa que quem o faça ou tente fazê-lo comete crime. E quem o comete criminoso é de fato, haja ou não a condenação que assim o defina. Tal é a condição que muitos ostentam e outros tantos elaboram para si.

A pregação de parlamentares identificáveis como um núcleo de agitação e provocação atenta contra a democracia. A excitação de hostilidades que esses parlamentares propagam pelo país é indução de animosidade antidemocrática –sem que isso suscite reação alguma, o que é, por si mesmo, indício da precária condição da democracia e da Constituição.

O que se passa hoje na Câmara, como método e objetivos da atividade, não é próprio de Congresso de regime democrático. Em muitos sentidos, restaura a Câmara controlada e subserviente da ditadura. Em outros aspectos, assume presunções autoritárias, de típico teor antidemocrático, ao ameaçar até aprovações do Senado de punitivas suspensões da sua tramitação.

Afinal, um dos focos da corrupção é arrombado. Os procuradores e juízes do caso receberam tarefa de importância extraordinária. Mas não é garantido que estejam plenamente respeitados nessa tarefa os limites das regras democráticas. À parte condutas funcionais que não cabe considerar neste sobrevoo do momento do país, é notória no grupo, e dele difundida, uma incitação a ânimos não condizentes com investigações e justiça na democracia. Pôr-se como salvadores da pátria, a partir dos quais “o Brasil agora será outro”, não é só um equívoco da ingenuidade. É uma ameaça, senão já algumas práticas, de poderes e atitudes exacerbados que fogem às regras.

Um exemplo que recebeu tolerância incompatível com sua importância: difundir informações inverídicas e sensacionalistas à imprensa, e ao país, “para estimular mais informantes” –como feito e dito por um procurador–, não é ético nem democrático. É autopermissão abusiva. E incitação a ânimos públicos que já recebem das realidades circundantes o bastante para serem exaltados.

O espírito antidemocrático não é alheio nem ao Supremo Tribunal Federal. É nele que um juiz pode impedir a conclusão de um julgamento tão significativo como o financiamento das eleições dos governantes e congressistas. Ou seja, dos que determinam os destinos do país e de seus mais de 200 milhões habitantes. Se alguém achar que é deboche, não vale a pena contestar. Mas convém lembrar que é uma evidência perfeita da prepotência primária, apenas ilusoriamente culta, que sobreviveu muito bem à ruína do seu sistema escravocrata.

Movimentos de ocupações urbanas e rurais são acusados de violar a democracia. É engano. Ilegais, sim, mas não são democráticos nem antidemocráticos. Sequer estão incluídos na democracia, desprovidos que são, todos os padecentes de grandes desigualdades econômicas sociais, de meios democráticos para obter os direitos que a Constituição lhes destina.

E os jornais, a TV, as revistas, o rádio –na verdade, os jornalistas que os fazem– nesse país que concebe a democracia como uma bola, tanto a ser chutada sempre, como a oferecer grandes e efêmeras euforias? Agradeço à sogra de um jogador de futebol, Rosangela Lyra, que me dispensa de alguns desagrados. Disse ela, à Folha, das pequenas e iradas manifestações que organiza pela derrubada do resultado da eleição presidencial: “As redes sociais amplificam e a mídia quintuplica”. Entregou. Delação de dar inveja aos gatunos da Petrobras.

“Isso é democracia” como slogan de antidemocracia só indica que o Brasil ainda não é ou já não é democracia.

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2 ideias sobre “Em nome da democracia

  1. Diogo Lima

    Jenio de Freitas Moreira mostrando toda sua falta de vergonha em mais um artigo minúsculo! Minúsculo de ideias, de caráter e de argumentos. Mais um picareta que já cansou. Gostaria de saber onde estava o jenio quando forçaram Collor a renunciar para evitar a cassação! Daí podia? Estes sem vergonha continuam insistindo na teoria do golpe, então deveriam devolver o mandato do collorido, que alias se comparado com hoje, ele poderia ser comparado com ladrão de balas. Está gente cansou, o discurso não convence. Fora jenio de Freitas.

  2. Sergio Silvestre

    Não sei a idade do comentarista acima,não do autor do artigo que por sinal hoje é o mais lucido de todos.
    Olha como distorcem as coisas os reaças raivosos ,postei no meu face o que eu vi na av Higienópolis,que as pessoas eram todas com aparência corada,de pele e olhos claros e que só vi um preto que vendia bandeiras na manifestação.
    Um que pensa igual ao comentarista acima me disse que eu era preconceituoso,me ameaçou dizendo ser PF ou coisa que valha e que eu ia receber uma visita dos federais.
    Olha só a situação de raiva do sujeito,e do jeito que a coisa vai,algum louco destes ai vai fazer besteiras.
    Noto que a velharia acima dos 70 anos são entregues as mídias lidas e absorveram seus ensinamentos e estes não mudam mais.
    A classe media alta se acha o alvo petista que tudo que acontece de ruim é culpa do PT,e eles saem a cata de petistas se pudessem ter uma cota maior o fariam para abater todos eles.
    E os jovens que estão se cagando pelo Brasil,são fãs do Malafaia e do Bolsonaro e querem um golpe militar.
    Então acho que é meio caminho andado,quando uma população começa a ressuscitar mortos vivos e cultuar figuras grotescas é sinal do fim dos tempos,onde se for ver a história os humanos não mudaram muitos a não ser andar sobra duas pernas.

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