7:01Crônica de um eleitor sem ilusão

por Célio Heitor Guimarães

Haverá novas eleições no domingo. Vamos lá, colega eleitor, ainda que sem nenhum entusiasmo. Pessoalmente, confesso que o acontecimento muito pouco está me interessando. Ao longo da caminhada, perdi as ilusões. Sejam quais forem os vencedores, nós, os brasileiros comuns, continuaremos onde sempre estivemos. Se não dermos duro, se não trabalharmos, se não lutarmos, não iremos a lugar algum, não daremos sustento a nossas famílias, não criaremos nem educaremos nossos filhos. Sequer sobreviveremos. E se dependermos do governo, estaremos perdidos.

Governo só se lembra do povo em época de eleição. É um mundo de promessas, sorrisos, abraços, gestos de simpatia e mentira, muita mentira. Uma vez eleito, os interesses mudam, o poder inebria e o povo passa a ser um estorvo. Os que valem são os donos do capital, os safados oportunistas, a prática ilícita, as vantagens pessoais e da patota palaciana. Ao povo os olhos serão voltados só nas próximas eleições.

Já tive surtos de esperança e de irracionalismo, e conclamei o eleitor a exercer, com cautela e dignidade, o seu direito de cidadão, indo às urnas e fazendo o melhor que pudesse pelo Paraná e pelo Brasil. Cheguei a evocar Rubem Alves, o filósofo do meu coração, que sempre teve a democracia como o ideal político mais bonito, baseado na ideia de que o povo pode decidir os rumos do país em que vive. Descobri que é só uma ilusão, saudoso Rubem. O povo não decide nada. Quem decide são os conchavos, a politicalha rasteira, a farsa montada por marqueteiros e a indução dos resultados dos institutos de pesquisas. Logo não haverá mais necessidade de eleição. É só empossar os líderes das intenções de votos. Isso me entristece profundamente.

A rigor, no Brasil não existe democracia. Pode existir liberdade de expressão e de comportamento, mas isso não é a democracia sonhada por nós. Aliás, já disse alguém, com quem concordo inteiramente, que só haverá realmente democracia no Brasil quando todos os brasileiros tiverem casa, trabalho, escola, segurança, tratamento de saúde e, ao menos, duas refeições por dia. Quer dizer: estamos ainda bem longe dela.

E como a regra é a democracia ser exercida por políticos, devemos ter sempre em mente a lição de Maquiavel, segundo a qual o que importa na política não é que o governante seja justo e eficiente, mas que ele pareça justo e eficiente.

A política é como aquela fábula do gato e dos ratos, também contada por Rubem Alves e já reproduzida aqui neste espaço: diante do perigo do gato, os ratos se unem e sonham sonhos de fraternidade, em que todos repartirão socialisticamente o queijo inacessível guardado pelo gato. Mas, morto o gato, os ratos logo se esquecem da solidariedade socialista e começam a engalfinhar-se por causa do queijo.

Nessa época eleitoral, é comum consumarem-se alianças tidas como impossíveis: lobos pastando com ovelhas, gaviões chocando ovos de rolinha, piratas abraçados com pacíficos marinheiros… Tudo gente da melhor qualidade, muito bem intencionada. E o povo é seduzido pelo teatro montado por marqueteiros e por pesquisas direcionadas.

2014 seria um ano marcado por dois acontecimentos: a Copa do Mundo no Brasil e as eleições gerais. Ao cabo de ambos, o resultado seria comemorado ou lamentado com choros ou risos. O que aconteceu com a Copa todos já sabemos. Restam-nos as eleições. E a expectativa não é das mais promissoras: se a atual mandatária da Nação for reeleita, o Brasil poderá afundar de vez; já as opções existentes não passam de incógnitas e os desacertos entre si podem entregar a reeleição de bandeja à “presidenta” já no primeiro turno. Na esfera estadual, então, não existe opção: nenhum dos principais candidatos é confiável. O Paraná está estagnado e terá o seu destino entregue ou a um comprovado incompetente ou a um desequilibrado juramentado ou a uma noviça pinçada do fundamentalismo petista que asfixia o país.

Ao ir às urnas e digitar os nomes e números escolhidos, enlevado pela modinha de Chico Buarque, o amigo eleitor pode achar que está se despedindo da dor prá ver a banda passar cantando coisas de amor. Não deve, porém, esquecer-se que aquele início de esperança e alegria no final muda de tom:

“Mas para meu desencanto / o que era doce acabou / tudo tomou o seu lugar / depois que a banda passou”…

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Uma ideia sobre “Crônica de um eleitor sem ilusão

  1. oto lindenbrock neto

    Caro Célio: Até parece que você não assistiu ao horário eleitoral na Tv. Eu assisti assiduamente e cheguei à conclusão que vivemos na Dinamarca, só que muito melhorada. Não seja ranheta ou fracassomaníaco -como diria FHC- e enxergue que nunca antes na história -como diria Lula – tivemos um governo tão bom. Faça parte do Paraná que acredita e viva Feliz!

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