17:15Jeitinho e vantagens

… Fux acha que juízes federais* ganham pouco (segundo a reportagem da Folha, os vencimentos giram em torno de R$ 25 mil) e são sacrificados: não recebem adicionais noturno, de insalubridade e de periculosidade, participação nos lucros, honorários etc. O ministro se esquece da estabilidade, da aposentadoria integral, da carga horária confortável, dos dois meses de férias e recesso, entre outros privilégios, e que o magistrado, ao assumir, adere às injunções próprias do cargo. 

Do artigo do advogado criminalista Luís Francisco Carvalho Filho (leia abaixo a íntegra)

*O ministro Fux estendeu o penduricalho salarial a todos os magistrados do país

Ao tratar do período colonial, Raimundo Faoro, em “Os Donos do Poder”, fala de uma “justiça tarda, incompetente, cruel”. Apesar de realidades tão distintas, seria despropósito aplicar os mesmos adjetivos aos dias de hoje? Os jornais trazem informações diversas que recomendam reflexão institucional.

O poeta e juiz Régis Bonvicino mostra que o Judiciário ajuda a financiar a “gastança” federal. O volume dos depósitos judiciais (valores pertencentes aos litigantes) ultrapassaria R$ 150 bilhões. Como os valores são remunerados com taxas inferiores às de mercado e como são depositados quase sempre (sem licitação) no Banco do Brasil ou na Caixa Econômica Federal, enquanto os processos se arrastam, a dinheirama faz a alegria do governo.

Além de ganhar com a diferença das aplicações realizadas no mercado interbancário, os depósitos ajudam no superavit primário. O dono do dinheiro sofre confisco, e o ativo não contribui para a eficiência dos tribunais.
Reportagem de Severino Motta chama a atenção para o jogo corporativista. O ministro Luiz Fux, do STF (Supremo Tribunal Federal), concedeu liminar dando a juízes federais direito de receber auxílio-moradia. A exceção é para aqueles que dispõem de residência funcional.

Fux acha que juízes federais ganham pouco (segundo a reportagem da Folha, os vencimentos giram em torno de R$ 25 mil) e são sacrificados: não recebem adicionais noturno, de insalubridade e de periculosidade, participação nos lucros, honorários etc. O ministro se esquece da estabilidade, da aposentadoria integral, da carga horária confortável, dos dois meses de férias e recesso, entre outros privilégios, e que o magistrado, ao assumir, adere às injunções próprias do cargo.

A Lei Orgânica da Magistratura diz que, além dos vencimentos, “poderão” ser concedidas vantagens aos magistrados, como o auxílio-moradia. O que era “possibilidade” se transforma em direito adquirido. Jeitinho torto de corrigir o que Fux considera defasagem salarial.

O círculo é vicioso. A benesse não para aí. Certamente vai alcançar membros de carreiras jurídicas de outras esferas, que se lançam, como aves de rapina, em busca de vantagens e equiparações.

Às vezes, como no mandato de Gilmar Mendes, o Conselho Nacional de Justiça resiste ao corporativismo. Veremos o de Ricardo Lewandowski.

Elio Gaspari traz notícia da pesquisa da FGV (Fundação Getulio Vargas) sobre o tempo no STF e seus problemas de gestão (não de solução jurisdicional). Ao traçar o desempenho dos 11 ministros, registra que Fux retém, desde 2012, processo que cuida da inconstitucionalidade de gratificações dadas a magistrados do Rio.

Quando a liminar que dá R$ 4,3 mil mensais de auxílio-moradia aos juízes federais será apreciada pelo STF? O despacho de Fux há de pairar, por anos, como fundamento para o reforço dos holerites?

Dirão que não se misturam alhos com bugalhos. Realmente, a ajuda do Judiciário para o fechamento das contas do governo federal não tem nada a ver com a lerdeza do Supremo, que não se relaciona com a generosidade de Fux.

Quanto à crueldade, tema de outra coluna, lembre-se, por ora, o desabafo de padre Vieira e que ilustra o diagnóstico de Faoro: “São piores os homens que os corvos”.

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Uma ideia sobre “Jeitinho e vantagens

  1. Professor Xavier

    Ficaria imensamente feliz se recebesse só o valor do tal auxílio-moradia, trocava a minha aposentadoria por este auxílio. Aviso que não moro debaixo de ponte ou viaduto, pois este parece ter sido um dos motivadores que culminou na concessão do tal auxílio aos magistrados, o pavor de que eles morem em lugares insalubres.

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