11:46O show dos erros

por Janio de Freitas

 

No primeiro plano, o espetáculo criado para a TV (alertada e preparada com a conveniente antecedência) mostrou montagem meticulosa, os presos passando pelos pátios dos aeroportos, entrando e saindo de vans e do avião-cárcere, até a entrada em seu destino. Por trás do primeiro plano, um pastelão. Feito de mais do que erros graves: também com o comprometimento funcional e moral de instituições cujos erros ferem o Estado de Direito. Ou seja, o próprio regime de democracia constitucional.

Os presos na sexta-feira, 15 de novembro, foram levados a exame de condições físicas pela Polícia Federal, antes de postos em reclusão. Exceto José Genoino, que foi dispensado, a pedido, de um exame obrigatório. Experiente, e diante de tantas menções à saúde inconfiável de José Genoino, o juiz Ademar Silva de Vasconcelos, a quem cabem as Execuções Penais no Distrito Federal, determinou exame médico do preso. Era já a tarde de terça-feira, com a conclusão de que Genoino é portador de “doença grave, crônica e agudizada, que necessita de cuidados específicos, medicamentosos e gerais”.

José Genoino não adoeceu nos primeiros quatro dias de sua prisão. Logo, deixá-lo esses dias sem os “cuidados específicos”, enquanto aqui fora se discutia se é o caso de cumprir pena em regime semiaberto ou em casa, representou irresponsável ameaça a uma vida – e quem responderá por isso?

A rigor, a primeira etapa de tal erro saiu do Supremo Tribunal Federal. A precariedade do estado de José Genoino já estava muito conhecida quando o ministro Joaquim Barbosa determinou que o sujeitassem a uma viagem demorada e de forte desgaste emocional. E, nas palavras de um ministro do mesmo Supremo, Marco Aurélio Mello, contrária à “lei que determina o cumprimento da pena próximo ao domicílio”, nada a ver com Brasília. O que é contrário à lei, ilegal é. O Conselho Nacional de Justiça, que, presidido por Joaquim Barbosa, investe contra juízes que erram, fará o mesmo nesse caso? Afinal, dizem que o Brasil mudou e acabou a impunidade. Ou, no caso, não seria impunidade?

Do mesmo ministro Marco Aurélio, além de outros juristas e também do juiz das Execuções Penais, veio a observação que localiza, no bojo de mais um erro gritante, parte do erro de imprevidência temerária quanto a José Genoino. Foi a já muito citada omissão da “carta de sentença”, que, se expedida pelo ministro Joaquim Barbosa, deveria anteceder o ato de reclusão. E só chegou ao juiz competente, para instruí-lo, 48 horas depois de guarda dos presos.

Com a “carta de sentença”, outra comunicação obrigatória deixou de ser feita. Só ocorreu às 22h de anteontem, porque o destinatário dissera às TVs não ter o que providenciar sobre o deputado José Genoino, se nem fora comunicado pelo Supremo da decisão de prendê-lo. Presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves vai submeter a cassação do deputado ao voto do plenário, e não à Mesa Diretora como uma vez decidido pelo Supremo. Faz muito bem.

Mas o Ministério da Justiça tem mais a dizer. E sobretudo a fazer. O uso de algemas durante o voo dos nove presos transgrediu a norma baixada pelo próprio ministério, que só admite tal imobilização em caso de risco de resistência ou fuga. Que resistência Kátia Rabello, Simone Vasconcelos, José Genoino poderiam fazer no avião? E os demais, por que se entregariam, como fizeram também, para depois tentar atos de resistência dentro do avião? Além de cada um ter um agente no assento ao lado. O uso indevido de algemas, que esteve em moda para humilhar empresários, é uma arbitrariedade própria de regime policialesco, se não for aplicado só quando de fato necessário. Quem responderá pela transgressão à norma do próprio Ministério da Justiça?

Com a prisão se vem a saber de uma violência medieval: famílias de presos na Papuda, em Brasília, precisam dormir diante da penitenciária para assegurar-se, no dia seguinte, a senha que permita a visita ao filho, ao pai, marido, mulher. Que crime cometeram esses familiares para receberem o castigo desse sofrimento adicional, como se não lhes bastasse o de um filho ou pai na prisão?

Medieval, é isso mesmo a extensão do castigo à família. Na Brasília que diziam ser a capital do futuro. Assim até fazem sentido a viagem ilegal dos nove para Brasília, as algemas e outros castigos adicionais aplicados a José Genoino e outros. E que vão continuar.

 

*Publicado na Folha de São Paulo

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7 ideias sobre “O show dos erros

  1. Estanislau - Livre Pensador na Curitiba dos Comissionados.

    Ichiiiiiiiiiiiii……o Jânio pôs no lixo o texto do Célio.

  2. leandro

    Lamentável a condição de saúde do Genoíno, confinado no Presídio da Papuda em Brasilia. Claro que não desejamos que o mesmo seja cometido de falência de sua condição física, pois psicológica já foi, mas, quantos e quantos Genoinos temos no Brasil, em presídios delegacias abarrotadas, se contaminando e sem o mínimo de condição de salubridade e quantos e quantos também sofrem de males piores que o do Genoíno ou igual e não vemos nenhum deputado oi senador fazer qualquer movimento politico para que o governo solicite da justiça medidas de tratamento humanos. Não não há manifestação alguma dos parlamentares. Mas com todo esse movimento que quando se reveste de paixões politica e partidárias poderá deixar alguns com um pé atrás e pensaria até quanto vale a vida do Genoíno para o PT, vendo tudo isso poderíamos até pensarmos que ele poderá se transformar em um mártir da ação politica, mas de quem, de qual grupo? Então quanto vale a vida de Genoíno para o PT?

  3. carlos

    Cara, com tanta coisa mais importante pra se ocupar, ficam discutindo os atos que levaram às grades essa turma de bandidos! Tá lá no autos: são todos membros de uma sofisticada organização criminosa. Se houve erros na prisão, o maior deles é a demora de quase 10 anos entre o cometimento dos crimes e o encarceramento. Sobre as ações do STF, acho que algum eventual equívoco é perfeitamente aceitável, já que esse tribunal não tem nenhuma experiência em mandar prender quadrilheiros. Injustiça seria se eles permanecessem soltos.

  4. jose

    Só uma observação.

    O tal janio não deixa claro:

    O exame no IML foi dispensado pelo próprio Genoíno e seu advogado.

    Ou seja, se ele tinha qualquer problema, a hora era aquela…

    E janio escorrega de novo e mostra a falácia que é o tal pt é feito de “gente do povo” ao escancarar que os familiares dos políticos condenados tiveram regalias que os outros não tem…

  5. Maringas

    cada vez quero me meter menos nesse assunto, mas…

    1 – “a lei que determina o cumprimento da pena próximo ao domicílio” – José Genoíno exerce mandato de Deputado Federal e recebe do Congresso Nacional auxilio moradia para morar em Brasília. Logo, o domicilio do deputado não é São Paulo.
    2 – “O uso de algemas durante o voo dos nove presos transgrediu a norma baixada pelo próprio ministério, que só admite tal imobilização em caso de risco de resistência ou fuga.” – As algemas só foram usadas no interior do avião. O Comandante da aeronave é a autoridade máxima a bordo, e ele é proibido de decolar transportando presos, sem que os presos estejam algemados, conforme regem as regras internacionais de segurança aérea.

  6. Estanislau - Livre Pensador na Curitiba dos Comissionados.

    E por causa desses – comentários – e de outros que a oposição não existe no país tratam a política como se fosse uma partida de futebol.

  7. antonio carlos

    Os comportamentos dos moradores da cidade do futuro, para alguns Ilha da Fantasia, são medievais porque os usos e costumes vieram todos da antiga Capital Federal. E pelo jeito eles se conservam os mesmos desde os tempos de antanho.

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