18:25HORÓSCOPO

por Zé da Silva

 

Escorpião

 

Por causa do bumbo ele viu Pelé jogar pela primeira vez. O bumbo de uma fanfarra. E quem tocava tinha o apelido de Saravá. Na noite de quarta ainda havia a concha acústica. Pacaembu. Menino ainda sentado nos bancos de madeira o coração batia mais que o bongô que viria anos depois na música do dois pra lá dois pra cá. Sim, ele tremia como as maracas, descompassado de amor por aquele time todo de branco, imaculado, glorificado, endeusado. Mas estava ali para ver Ele, como dizia o locutor da TV Tupi. Não sabia quem era o adversário, nem lembra de quanto foi o placar, porque ficou para sempre, marcado a ferro em brasa na memória, apenas um lance, tão simples, que acontece em quase todas as partidas – e ele viu centenas depois. Pelé perto da linha lateral, do lado direito, mais ou menos na altura da divisória do campo, sem olhar dá um passe que atravessa tudo, pelo alto, e vai cair bem no pé bom do ponta esquerda, que era Edu. Por que aquilo ficou para sempre? Talvez o arco que a bola descreveu, bola branca na noite fria. Talvez o fato de o companheiro Dele não ter mexido um único músculo para receber a pelota. Edu apenas matou a redonda com a classe que Deus também lhe deu e prosseguiu a jogada. O menino de então não lembra se houve gol, quem venceu a partida, nada. Mas aquele lance ficou. Assim como, antes do início do jogo, no meio do campo, a fanfarra fazendo evoluções e aquele que o tinha levado fazia evoluções e tocava o bumbo. Saravá!

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