por Zé da Silva

Touro

Três meses depois ele abriu a geladeira e viu. O pequeno ponto de diamante negro olhava para ele. A luz fria do interior fazia o ouro em volta brilhar. A aliança estava ali. Sempre esteve ali. Desde o dia em que ele notou o dedo nu ao fazer um exercício na academia. Era a segunda em menos de meio ano. A segunda a desaparecer. Ela não acreditava mais. Ele fez a piada. Aquela do criado mudo do puteiro. Ela riu amarelo. Passou. Mas agora tinha sumido de novo e ele não sabia como. Nunca usara aquele adereço. Casou mais vezes que o Vinícius. Mas gostou quando ganhou o que agora não chamava mais de bambolê de otário. E ela sumiu duas vezes. A primeira, sabe-se lá onde. A segunda, também não sabia até aquela manhã em que foi procurar o resto de uma fruta para a vitamina diária. Estava fraco. Entrara no inferno porque a ausência daquele aro de ouro com diamante como olho preto fez o mundo sucumbir dentro de si mesmo. Ela sumiu sem deixar sinal. Ele ficou ali perdido sem sair de casa, sem vontade de tomar banho, esperando um telefonema que nunca veio. A imagem da aliança ali, de onde nunca saiu, o congelou. Pensou em quantas vezes tinha aberto aquela porta que várias vezes tentou arrebentar de raiva da vida. Centenas? Milhares? Ele pegou a joia. Colocou no dedo. Fechou a porta e os olhos e sentiu que a vida tinha voltado a correr pelas veias. Um cachorro latiu ao longe. Uma campainha tocou.