6:51Cuidado, Francisco!

por Célio Heitor Guimarães

Estou preocupado com o Francisco. Qual Francisco? Ora, minha senhora, qual Francisco se encontra na ordem do dia, além do recém eleito sumo pontífice, o novo papa? Pois é com ele que eu ando preocupado. E não pelo fato de ser argentino ou jesuíta ou por já haver vivido longos 76 anos ou por ter apenas um pulmão em funcionamento e problemas no estômago. A minha preocupação decorre de outros fatos.

Francisco deve a escolha de seu nome ao cardeal emérito brasileiro Cláudio Hummes, “un amico, um grande amico”, que, ao cumprimentá-lo depois da escolha, pediu-lhe ao ouvido: “Não se esqueça dos pobres”. O franciscano gaúcho Hummes é conhecido por suas preocupações com os menos favorecidos e com as questões sociais. Na Sé de São Paulo, fez parceria com o cardeal Paulo Evaristo Arns na defesa dos direitos humanos e na contestação ao regime militar brasileiro. Quer dizer: cabe no rol dos perigosos “cardeais comunistas” da Igreja Católica.

Além do que, tão logo se tornou Francisco, Jorge Mario Bergoglio já “chutou o balde”. Arredou o luxo e a pompa do anúncio de sua eleição. Recusou a tradicional capa vermelha decorada com pele, que tanto agradava o antecessor Bento XVI, e surgiu na sacada da Basílica de São Pedro com traje de simplicidade franciscana. Prescindiu também do crucifixo de ouro, símbolo da ostentação e riqueza do Vaticano, preferindo manter no peito o seu antigo crucifixo de ferro.

Depois da cerimônia, dispensou a limusine papal e deixou a Capela Sistina no micro-ônibus junto com os demais cardeais, aos quais teria dito, um pouco antes, “Deus os perdoe pelo que vocês fizeram”.

No dia seguinte, em um veículo comum, foi buscar os seus pertences no hotel dos clérigos onde ficara hospedado durante o conclave e fez questão de pagar a conta do próprio bolso. Em seguida, fez uma visita surpresa a outro cardeal argentino que se encontrava internado em um hospital de Roma.

Quando foi levado a conhecer os aposentos do papa no Palácio Apostólico, levou um susto. “Meu Deus, há espaço aqui para umas 300 pessoas. Eu não preciso disso tudo” – teria exclamado Sua Santidade.

E o pior é o que tem dito, em público e na intimidade: “Está na hora de a Igreja se abrir mais ao mundo, para não correr o risco de ficar fechada em si mesmo”. “Se a Igreja permanecer fechada em si mesma, ela envelhece”. “Se não processarmos Jesus Cristo, se não difundirmos a palavra de Jesus pelo mundo, nos tornaremos uma ONG beneficente, mas não uma Igreja”.

“Não adianta ao católico ocupar altos cargos na hierarquia da Igreja, caso ele vire as costas para a cruz”. “Quando caminhamos sem a cruz, quando construímos sem a cruz e quando confessamos um Cristo sem a cruz, não somos discípulos do Senhor. Somos mundanos, somos bispos, padres, papas, mas não discípulos do Senhor”.

Ontem, na primeira homilia pública, falou no perdão e desejou um bom almoço aos fiéis presentes à Praça de São Pedro.

Se passar da palavra para a ação, o novo papa corre o risco de desencadear uma revolução na Igreja Católica, em franca decadência. Se não tanto, pelo menos fazer uma faxina de bom tamanho, devolvendo o catolicismo à sua essência, ainda que ele condene o aborto e a união entre pessoas do mesmo sexo. E é aí que mora o perigo.

Imagine-se o que ocorrerá nos intestinos da Cúria Romana se Francisco recusar-se a ocupar o apartamento papal, fizer mudanças na hierarquia da Santa Sé (a começar pelo cardeal Bertone, atual secretário de Estado), indagar sobre o Instituto para as Obras de Religião, mais conhecido como Banco do Vaticano, e colocar o dedo nos escândalos que balançam a Igreja nos últimos tempos, como a corrupção e a pedofilia…

Recordai-vos que o último papa que andou falando e planejando coisas semelhantes – como morar fora dos aposentos oficiais, reduzir as riquezas da Igreja e fazer uma auditoria séria no tal Instituto para as Obras da Religião – foi o risonho e doce João Paulo I. E deu no que deu. Ele durou exatos 33 dias no poder.

Por isso, cautela, caríssimo Francisco. E não se esqueça de passar a chave na porta do quarto antes de dormir, seja ele onde for, e não aceite qualquer chazinho de cortesia, ainda que servido por uma boníssima alma purpurada. Melhor será V. Santidade continuar fazendo a sua própria comidinha, como costumava fazer quando era o arcebispo de Buenos Aires.

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