8:16Atochai vossas tochas, bretões

por Ivan Lessa*

No momento em que deixo minha tochinha de lado para digitar minhas sandices informativas faltam precisamente três meses para o início dos espetaculares (eles que dizem) Jogos Olímpicos de Londres de 2012.

Sem falar nas “Paraolimpíadas”, para o que destacam um inusitado espaço nas vias de comunicação jornalísticas, sabe-se lá porquê. A torcida torce para que tudo fique pronto tempo e que saia o mínimo de besteira possível.

Algo assim feito o símbolo que foram desenterrar – é, parece coisa que um animal raro fez e depois enterrou na areia envergonhado – para simbolizar os terríveis eventos que terão a duração de 2 (duas) longas e tediosas semanas.

No entanto, o faniquito quebra recordes. Principalmente entre os meios de comunicação e as inúmeras, as vastas, as infindáveis autoridades encarregadas de lidar com as barbaridades que vão ocorrer: de espectador paquistanês morto por arremesso de dardo à perna quebrada de colombiana nas cercanias do decatlo.

Curiosamente, o turismo já reservou quartos em hotéis. Deles é o Reino dos Céus. Vendedor de sanduíche de esquilo cinzento já esfrega “as mão” (é assim que eles se expressam) pensando nos régios lucros.

O objetivo não é competir; é faturar. Os pobres da Europa se assanharam. Deles é o Reino dos Céus, mas eles não querem perder, nesta terra, a boquinha de pedir esmola para passante.

A polícia pegou um aumento para pegar pobre com jeito, quer dizer, assim como quem passa mal o bastão e dá com ele na cabeça dos brutos correndo ao lado.

Sou informado que, graças à informática, muito gente boa, ou ao menos razoável, irá trabalhar de casa, embora eu não entenda como é que se pode servir um Big Mac e um milk-shake de chocolate pelo computador.

As viagens de metrô, aquelas normais, ida e vinda do trabalho, que levam uns 30 minutos num mau dia, que são quase todos, frise-se, passarão nas fatídicas duas semanas de verão a ocupar, de pé e com carteira batida e mão passada na bunda, umas 3 ou 4 horas da vida da tchiurma. Isso, com sorte.

Mais alto, mais rápido, mais forte, é o que se diz e se repete a cada Olimpíada. E assim vem sendo. No caso do crime organizado, claro.

Nas pistas, poucas novidades. E quando as há é afro-caribenha, o que irrita os racistas locais ou em estado de viagem de férias, que eles também (ou só) se acham “gente”. Já estão rindo com o bilhete de viagem nos bolsos largos.

Satisfeitos, perguntam quando é que irão surgir, dessa origem étnica, as equipes de polo aquático, mergulhos de trampolim e ginástica sincronizada. Ficam alegres com a falta de resposta.

E depois dos pilantras locais, mais estão chegando. A delegação romena, além de outras nacionalidades menos populares ainda estão chegando de trem, carona, ônibus, o que estiver dando sopa.

Mendigos das mais variadas nacionalidades, prostitutas de todas idades e para todos os gostos, tudo bolado por quadrilhas olímpicas em suas respectivas terras natais se encarregam de uma farta distribuição.

A passagem subterrânea de Marble Arch, muito utilizada para quem vai trabalhar sem tocha na mão, já está repleta, informa-me a imprensa, de romenos (o que é que há com os romenos?).

Nos arredores, à noite, cerca de 60 espécimes dormem ao relento deste abril chuvoso. Nas alturas do Hotel Cumberland, até que razoável, marafas menos que razoáveis, mas chamadas de “alta classe”, rondam e cospem na calçada e buscam chamar a atenção de possíveis fregueses com esgares e o coçar flagrante de suas feridas mais expostas.

Uma grande honra é a disputa para sortear a equipe de pessoas que, numa tradição das mais marotas, irá transportar as tochas olímpicas de seu berço incógnito até a pira sagrada que ficará acesa durante todo o tempo desse atraso de vida de competição.

Houve concurso para o melhor “design” da peça em questão. Venceu o pior, um que parece cone de sorvete vazio.

São festejados e cobertos de honrarias os corredores com tochas. Talvez não se entusiasmassem tanto se soubessem que a cerimônia da correria sinistra teve sua origem não na Grécia Antiga, mas sim na Alemanha Nazista no decorrer dos Jogos Olímpicos de 1936.

Seu brilhante idealizador nem sequer tem uma prova com seu nome ou perfil na medalha. Cuidava de propaganda e chamava-se “doutor” Joseph Goebbels.

*Colunista da BBC Brasil

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