8:54O principal, sempre esquecido

O pedido de afastamento da presidência da Câmara Municipal anunciado ontem pelo vereador João Claudio Derosso é esclarecedor e resume bem o pensamento da maioria dos políticos desta cidade, deste estado, deste país – o povo, o eleitorado, aquele que deu o voto de confiança no legislador, o que sustenta este Poder, não foi citado, foi esquecido, parece que não existe, parece ser um fator que não necessita do mínimo de satisfação. O que importa é uma satisfação aos parceiros, ao Ministério Público, ao Tribunal de Contas, ao Poder Judiciário, todos estes, aliás, pilares das tais instituições democráticas, mas que também devem única e exclusivamente atuar para a ninguenzada que nem sabe direito como funcionam – e por isso mesmo necessita dessas instituições para poder não serem explorados até o osso da alma exatamente por aqueles em quem confiam e a quem pagam. O personagem em questão tem todo o direito da defesa, de provar que a chuva de denúncias que caiu sobre sua cabeça fazem parte de um jogo político ou algo que o valha, como afirmou logo no começo do temporal que durou quatro meses, mas ganharia muitos pontos se desde o primeiro pingo que começou a  manchar seu currículo de poderoso, com cinco mandatos como presidente da Câmara Municipal, fizesse o que fez ontem. Ele preferiu medir força, mesmo que o primeiro sinal tenha sido dado pelo prefeito Luciano Ducci (PSB), que descartou-o de saída de um acerto feito para que fosse o vice na chapa para a eleição do ano que vem – logo ele, Derosso, que foi escalado para convencer o então tucano Gustavo Fruet a desistir da ideia de ser candidato do grupo liderado pelo governador Beto Richa (PSDB), mesmo porque o jogo estava jogado desde antes da eleição para o governo do Estado. Ducci disse, da França, que não havia acordo nenhum, ou seja, jogou Derosso ao mar. Richa, que não é de meter a mão em cumbuca onde há chumbo quente, ainda deu sinal tímido de apoio, mas foi recomendado por quem está próximo a se manter distante. Derosso também fez de conta que não ouviu o deputado estadual Valdir Rossoni, tucano que preside a Assembleia, afirmar em público que não era possível o partido ter um chefe de Legislativo alvo de tantas denúncias, principalmente num ano em que deu uma sacudida na Assembleia espanando parte da sujeira acumulada durante décadas. Ou seja, Rossoni disse que Derosso deveria sair do partido. Como os ministros de Dilma Rousseff que foram caindo com o mesmo discurso da negação das acusações que alimentavam manchetes, Derosso resolveu peitar tudo e metralhado durante longos quatro meses, até o Ministério Público pedir o que os vereadores da Oposição e alguns até da situação pediam desde o começo. Neste espetáculo houve cenas dignas de uma tragicomédia. A base de sustentação do governo municipal demorou séculos para apoiar, assim, de uma hora para outra, como se tivessem sido iluminados, uma CPI que, na sua formação, com presidente e relator abraçados ao denunciado, indicava e indica um final conhecido. Conhecido de quem? Daqueles que parecem não existir, como no comunicado oficial. A ninguenzada que vota, que elege seus representantes, já viu este filme muitas e muitas vezes. No fim o mocinho perde – e o mocinho, nessa história, é o que fica vendo o espetáculo sem poder interferir, apenas torcendo para que a Justiça cumpra o seu papel, o que parece ser complicado também porque os processos são lentos e reforçam a ideia de que há um congraçamento nos bastidores deste imenso palco – daí, talvez, as citações do vereador para pedir três meses de licença do cargo. O episódio também mostra como funciona a política e os políticos quando explodem casos parecidos. Derosso, que sempre foi um dos pilares do tucanato, agora parece material radiotivo, ninguém quer chegar perto. Mesmo que prove inocência em todas as acusações e se reeleja no ano que vem, ficará marcado para sempre e lhe restará do poder as recordações do seu longo reinado. Talvez tudo fosse diferente se tivesse, sempre, lembrado daquilo que esqueceu até na hora de anunciar a licença – o povo que o elegeu.

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Uma ideia sobre “O principal, sempre esquecido

  1. tony

    Pena que a nossa Câmara é composta desta gentalha, porque se assim não fosse, o DerOsso já teria largado o Osso. E já teria sido cassado. ACarlos

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