21:54HORÓSCOPO

por Zé da Silva

Capricórnio

Andou e andou e andou até os pés e os joelhos incharem e sentir não haver mais ar no mundo. Durante os dias, meses e anos que atravessou bairros, cidades, estados, países e continentes, carregava dentro a raiva deflagrada por…. por…. Descobriu que nem lembrava mais. Provavelmente uma palavra, um gesto, algo que tinha lhe ferido a alma já bastante castigada por dúvidas, erros, pesadelos que arrancaram da memória o que só via de felicidade em fotos amarelecidas. Sim, uma dessas coisas o fez fugir, sair, andar, para não cometer o pior, para não sentir o gosto do sangue que sabia existir lá na escuridão do desconhecido, como na alma de Lawrence Peter O’toole, que um dia viu declarar, numa tela de cinema vagabundo, o prazer sentido depois da primeira ceifar a vida do primeiro inimigo numa batalha no deserto. Sentou à beira daquele caminho e descobriu que estava diante do mar e tinha às costas uma montanha. O lugar que sempre quis para viver até morrer. Mergulhou na primeira onda e o sal o fez sentir as feridas espalhadas no corpo. Essa dor reativou a memória – e ele começou a rir. Porque, recordou, o que tinha recebido era uma carta com ataque besta. E quem escreveu não era do seu mundo. Achou então tinha sido melhor não responder na hora. Porque, apesar de tudo, se sentia parte da parte que vale a pena. Então riu, riu, riu e riu como se aquilo que em forma de letras fosse a maior piada de todos os tempos.

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