12:24Embrutecer é aceitar a violência

por Thea Tavares

É chocante perceber o quanto a sociedade vai embrutecendo em meio à violência cotidiana, que em Curitiba já fugiu do controle há muito. Vi no telejornal da noite passada uma reportagem sobre as mortes violentas neste feriado de carnaval e um pequeno ponto despertou também a minha atenção: foi quando a repórter narrou o episódio da morte de um menino de 11 anos, cujos pais ainda estavam até o início da noite de ontem hospitalizados e em estado grave, vítimas de ferimentos por armas de fogo. É profundamente lamentável, triste o que aconteceu e a gente não pode perder nunca a capacidade de se indignar contra a barbárie social. O que me intrigou também na notícia foi que repórter descreveu o assassinato do menino como sendo a única morte violenta de uma pessoa “totalmente inocente” (pelo menos foi esse o sentido das palavras utilizadas) no rol do horror descrito na matéria. Então, numa análise lógica, seria possível concluir que as outras vítimas carregariam alguma culpa por serem assassinadas?

No relato de notícias como estas, estamos acostumados a ouvir termos cada vez mais usuais: ‘foi motivada por briga de gangues’, ‘a polícia suspeita de ligação com o tráfico de drogas’ e por aí vai. Há até uma demarcação geográfica desse tipo de ocorrência: Vila das Torres, Tatuquara, Cajuru… Alguns podem entender tal interpretação como leitura de fatos, e o é certamente, mas me preocupo com a onda de “aceitação” que se cria em torno das tais mortes violentas; da tese de suposto “merecimento” por esse destino maldito e brutalmente traçado.

E, com isso, a gente vai eximindo cada vez mais o poder público da responsabilidade com cuidados básicos à população, como o suporte às famílias, a geração de oportunidades de trabalho, especialmente para os jovens, o próprio policiamento e também a inexistência de instituições públicas para o tratamento, recuperação e ressocialização dos usuários de drogas, entre outras. Exige-se apenas e tão somente da família a força e a capacidade de resistência que dêem conta de solucionar o caos e remendar o tecido social já todo esgarçado. Essa visão não contribui e o descompromisso decorrente dela apenas aprofunda a barbárie. O embrutecimento nos anestesia, paralisa e é uma forma ilusória de acreditarmos e nos sentirmos imunes a essa violência que se avizinha.

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