11:40A graça de Curitiba na versão de Dante Mendonça

por  Ernani Buchmann 

         Doravante Mendonça. A brincadeira não é minha, mas do autor da apresentação, Jaime Lerner. A orelha do ex-prefeito é a terceira grande atração de Curitiba, Melhores Defeitos, Piores Qualidades, de Dante Mendonça (Bernúncia Editora, 287 pg). As duas primeiras são o título do livro e a fotografia da capa, mostrando comerciantes da Rua Voluntários da Pátria e funcionários da prefeitura em um churrasco no buraco resultante da canalização do Rio Ivo. O episódio é de 1971, contado com o humor que a prosa do autor escancara.

         O livro não pára de surpreender. O prefácio é um cartum de Tiago Recchia. A partir dele, a leveza do texto nos leva a épocas distintas, da carroça ao ligeirinho, dos modernos aos personagens mais antigos.

Dante relaciona o que considera nossas piores qualidades, como os monumentos que aqui abundam – e justiça se lhes faça, podem ser divididos entre os feios e os ainda piores. Melhor é enumerar, no capítulo dos bons defeitos, as obras deixadas nos muros e paredes pelo grande Poty. E é dele, Napoleon Potyguara Lazarotto, outro grande momento do livro: o mapa que desenhou, a lápis e a cores, como um guia turístico para um amigo que pretendia desvendar Curitiba.

         Estão lá também os mais significativos escritores locais. Dante cita trechos de obras de Manoel Carlos Karam, Jamil Snege, Paulo Lemiski, Nireu Teixeira, Sérgio Mercer e Valêncio Xavier, todos falecidos, e de diversos outros autores ainda passíveis de ser encontrados em nossas esquinas por muito tempo mais, como Wilson Bueno e Cristóvão Tezza. Publica entrevista com o jornalista pernambucano Fernando Pessoa Ferreira, responsável por um grande rebu na vida curitibana ao escrever, em 1967, a crônica Curitiba, a Fria, também reproduzida. Ferreira quase foi considerado persona non grata pela Câmara Municipal, ele que aqui havia vivido dez anos. Naqueles tempos rubicundos, o humor curitibano estava em falta.

         Dalton Trevisan é protagonista, ora se não. O autor entrevista o Vampiro, dá a ele o destaque que merece, por ter sido desde os anos 40 o maior divulgador da cidade, quase sempre glorificando seus piores defeitos.

         Esta Vila de Nossa Senhora da Luz dos Pinhais não é de se deixar revelar por sociólogos, penso eu. Talvez esconda material para arqueólogos de mentes, desculpem o trocadilho. Pois que seus escritos fiquem juntando poeira nas estantes. Dante evita os tratados professorais, os textos rebarbativos. Ao escrever, fotografa a cidade com humor, recurso mais adequado e interessante ao leitor.

Curitiba está toda ali, nua como jamais ousou se mostrar. Não falta nada nem ninguém. A um faroês, ou seja lá qual for o gentílico dos habitantes da Ilha de Faroe, a um kosovar ou um javanês, bastará ler Curitiba, Melhores Defeitos, Piores Qualidades para se sentir catedrático em curitibanices.

         Jaime Lerner escreve que “este livro marca a passagem de Dante do desenho para a crônica”. Acho que é mais. Dante é um tradutor da alma curitibana. Mesmo mantendo aquele forma catarinesca de falar, será para sempre, a partir de agora, um dos maiores cronistas que Curitiba haverá de conhecer. Dante criou uma obra tão agradável quanto a cidade que o inspirou.

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2 ideias sobre “A graça de Curitiba na versão de Dante Mendonça

  1. juruninha

    Bem que eu sempre disse: o maior puxa-saco que o Jaime Lerner já teve é o Dante Mendonça.

  2. Pé Vermelho

    Todo e qualquer curitibano tem a obrigação de ser puxa do dr. Jêime. E com muita honra. E sobre o Dante, o dia só começa para mim depois de lê-lo…depois das minhas orações, claro!

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