10:48Agora é Maristela!

Reportagem de Rosiane Correia de Freitas publicada hoje na Folha de Londrina:

Gestão de Maristela no MON pode ser irregular

Conforme Ministério da Justiça e MPF, com o acúmulo dos cargos de secretária especial com o de administradora da Sociedade dos Amigos do MON, entidade não poderia obter título de Oscip

 
Curitiba – A gestão de Maristela Quarenghi de Mello e Silva, esposa do governador Roberto Requião, a frente do Museu Oscar Niemeyer (MON) apresenta indícios de ilegalidade. Maristela acumula um cargo de secretária especial no governo do Paraná com o de presidente do Conselho de Administração e diretora executiva da Sociedade dos Amigos do MON.

Para o Ministério da Justiça (MJ), em resposta a consulta formulada pela reportagem da FOLHA, a presença de um servidor público em cargo de administração de uma entidade torna ilegal a obtenção do título de Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (Oscip), que é concedido pelo Ministério.

A Sociedade dos Amigos do MON foi criada em junho de 2003. No mesmo dia, Maristela foi eleita diretora-presidente. No dia 4 de julho daquele ano, a instituição recebeu a qualificação de Oscip, o que garante a entidade a possibilidade de celebrar Termos de Parceria com o Poder Público.

Dezoito dias depois, a primeira-dama foi nomeada para um cargo em comissão na governadoria. Segundo o MJ, apesar da nomeação ter acontecido depois da obtenção do título, a ilegalidade permanece. O órgão informou à reportagem que a fiscalização desse item da qualificação como Oscip é feita através da cópia da ata de eleição da diretoria e do relatório anual apresentado pela entidade ao Ministério.

A Sociedade já apresentou ao MJ os relatórios referentes aos anos de 2006 e 2007. Em ambos, Maristela Quarenghi aparece como presidente da entidade. No questionário relativo a qualificação da diretoria, a Sociedade informa que Maristela é jornalista, não recebe remuneração da Oscip e não é funcionária pública.

Em 2004, a Secretaria de Estado da Cultura (SEEC) firmou um Termo de Parceria com a Sociedade, transferindo para a entidade a função de administração e gestão do Museu. Desde então, a entidade já recebeu R$ 8,4 milhões em recursos do Governo do Paraná. E captou outros R$ 23 milhões através da Lei Rouanet.

O Termo de Parceria é um instrumento jurídico instituído pela lei 9.790/99 – a chamada Lei das Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público (Oscips) – para contratos entre entes públicos e instituições que detém esse título.

Para o procurador do Ministério Público Federal (MPF), Sérgio Arenhart, a situação da Sociedade é inédita. ”Nunca tinha visto esse tipo de irregularidade”, conta. Segundo Arenhart, em situações como essa, qualquer pessoa pode denunciar a irregularidade junto ao MPF ou ao MJ.

Para ele, se comprovada a ilegalidade, a organização pode perder o título de Oscip, ter os contratos celebrados durante o período de vigência da titulação rompidos e ainda ter que devolver os recursos ainda não aplicados no objeto do Termo de Parceria.

Já o MJ não vai tão longe. Questionado sobre o destino da Sociedade caso a ilegalidade seja confirmada, o Ministério informou que se a própria entidade demitir o servidor público em questão a ilegalidade fica resolvida. O MJ informou também que abrirá processo administrativo caso receba uma denúncia formal através de formulário disponível no site www.mj.gov.br ou comprove a irregularidade durante o processo anual de prestação de contas da entidade.

”Não é tão simples assim”, responde o procurador. Para Arenhart, a entidade, caso confirmada a ilegalidade, teria obtido vantagens devido a qualificação como Oscip mesmo sem ter preenchido todos os quesitos para ter direito ao título. ”É uma questão mais complexa.”

Já o advogado Paulo Haus Martins, especialista em legislação do terceiro setor e presidente da Comissão de Assuntos Jurídicos das Ongs da Ordem dos Advogados do Brasil, Seccional do Rio de Janeiro (OAB-RJ), diz que a interpretação do MJ que aponta como ilegal a participação de servidores públicos na administração de Oscips é inconstitucional. ”Isso fere o direito que o servidor tem à mobilização social.”
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Curitiba   – O advogado Paulo Haus Martins, especialista em legislação do terceiro setor e presidente da Comissão de Assuntos Jurídicos das Ongs da Ordem dos Advogados do Brasil, Seccional do Rio de Janeiro (OAB-RJ), avalia que o que é grave numa situação como a da Sociedade dos Amigos do Museu Oscar Niemeyer (MON) é a transferência de recursos do governo para a entidade. ‘‘A presença de uma primeira-dama do Estado no   conselho e na diretoria de uma organização que mantém contratos com o governo estadual pode ser uma afronta ao artigo 37 da Constituição Federal’’, disse. Segundo o procurador Sergio Arenhart, do   Ministério Público Federal (MPF), a celebração de um contrato entre o governo do estado e uma entidade que tem como presidente uma secretária especial também pode ser alvo de questionamento. ‘‘Mas essa seria uma investigação que está no espectro de atuação do Ministério Público Estadual’’, explica. ‘‘É claro que alguém com um vínculo tão forte com a   administração pode ter sido privilegiada’’, aponta. Como não teve acesso à documentação da organização, o procurador preferiu analisar o caso em tese. ‘‘A rigor, uma situação como essa fere os princípios da administração pública’’, diz. É esse também o entendimento do advogado Marcus   Bittencourt, mestre em Direito Público e professor da Escola de Magistratura Federal do Paraná, que avaliou o caso em tese, por não ter tido acesso a documentação da entidade. ‘‘O que se questiona num caso como esse não é   qualidade do serviço prestado pela OSCIP nem a competência dos profissionais envolvidos. A questão é que esse relacionamento próximo, da primeira-dama e secretária especial de governo dá margem para questionamentos’’, analisa. Bittencourt também aponta outro problema.‘‘No Termo   de Parceria, a responsabilidade pela avaliação dos resultados obtidos pela entidade é do Governo do Estado. A questão é saber se, nessas circunstâncias, essa é uma fiscalização eficiente’’, diz. A Sociedade possui um contrato com a Secretaria de   Estado da Cultura (SEEC) para gerir a administração do MON. ‘‘O primeiro Termo de Parceria firmado entre a Secretaria e a Sociedade é de 2004’’, informa o assessor jurídico da SEEC, Aloísio Miecznikowski. O contrato, segundo Miecznikowski, prevê a ‘‘administração predial’’ do museu. ‘‘É uma questão básica que os contratos públicos   respeitem os princípios da administração pública de moralidade e impessoalidade’’, aponta o advogado, que analisou o caso, em tese, por não conhecer os detalhes do Termo de Parceria firmado entre a SEEC e a Sociedade. Questionado sobre o assunto, o Ministério   Público do Estado (MPE) informou, através de sua assessoria de comunicação, que não há até o momento nenhuma investigação sobre o caso. Entenda o caso Supostas irregularidades apontadas na OSCIP: – O Ministério da Justiça (MJ) entende que servidores públicos não podem participar da diretoria – cargo responsável pela administração, gestão e representação judicial e extra-judicial da organização – de uma Oscip. – Maristela Requião ocupa, desde julho de 2003, cargos em comissão no Governo do Estado, simultaneamente ao cargo de diretora-presidente (e, em 2007, presidente) na Sociedade dos Amigos do MON. Por conta disso, a entidade não poderia ser qualificada como Oscip. – A contratação, pela SEEC, de uma entidade cuja representante legal é uma servidora pública seria supostamente irregular sob os princípios da administração pública de impessoalidade, moralidade, economicidade. Fonte: Ministério da Justiça, advogados especialistas em Direito Administrativo.

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Sociedade gere Museu desde 2004

A Sociedade dos Amigos do Museu Oscar Niemeyer (MON) é formalmente responsável pela administração e gestão do museu desde 2004. A informação é do assessor jurídico da Secretaria de Estado da Cultura (SEEC), Aloísio Miecznikowski. ”Na época, a Procuradoria-Geral do Estado foi ouvida e aprovou o conteúdo da parceria”, conta.

O assessor explicou que a entidade, por ser privada, teria condições de captar recursos através da Lei Rouanet, via mecenato (quando a iniciativa privada patrocina projetos culturais e obtém o direito de debitar o valor investido do Imposto de Renda devido), para viabilizar as exposições do museu.

”O Estado não tem essa prerrogativa. Para patrocinar eventos culturais como as exposições ele teria que recorrer ao Fundo Nacional de Cultura, que não tem recebido muitos recursos ultimamente”, diz.

Segundo Miecznikowski, o governador Roberto Requião tem se mostrado reticente em autorizar parcerias com entidades privadas mas, no caso do museu, ”seria mais complexo criar uma fundação estadual”. ”Uma fundação poderia captar via mecenato, mas estaria presa pelas mesmas amarras burocráticas que o governo”, avalia.

Sobre a possibilidade da SEEC ter aberto um edital de projetos para escolher uma entidade para administrar o museu, o assessor informou que ”a nível de Brasil não conhece um edital dessa natureza”.

A reportagem da FOLHA tentou conversar com a primeira-dama, Maristela Quarenghi de Mello e Silva e com Vera Regina Maciel Coimbra, diretora administrativa e financeira da Sociedade dos Amigos do Museu Oscar Niemeyer, sem sucesso. Através da assessoria de comunicação do Museu, a diretoria da entidade solicitou que a reportagem procurasse a SEEC, a Casa Civil e a Secretaria de Estado da Administração e Previdência.

A Casa Civil informou, através de sua assessoria, que Maristela continua nomeada secretária especial e que desde 22 de julho de 2003, data de sua primeira nomeação, não deixou de manter o vínculo com o Governo do Estado. A Secretaria, no entanto, não quis se pronunciar sobre outras questões a respeito da Sociedade e do Termo de Parceria.

Já o procurador-geral do Estado, Carlos Frederico Marés de Souza Filho, informou que não poderia conversar com a reportagem porque estava ocupado acompanhando um julgamento.

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