por Osman Gadoso

Capricórnio

Não há nada mais forte do que a palavra. Pode-se quebrar ossos, cortar a língua, marretear mãos, trucidar o corpo e jogar os pedaços aos javalis, mas a palavra foi escrita, foi dita, e passada, e entranhada nas consciências e será eterna, daí sua força indestrutível, daí o medo de quem tem a força momentânea, o pode efêmero. E a palavra salva vidas, seja dita dentro de uma igreja, no carrossel no parque, no meio de uma torcida de Atletiba. Foi assim com ele, que ouviu a palavra, tão simples e absurda ao mesmo tempo, e flutuou sobre os espinhos como disse um dia o cabôco Junco Verde num terreiro. Por isso vai soltando palavras, para ver se pelo menos um filho de Deus seja agraciado com o mesmo milagre. E olha os desvalidos, os largados pelas ruas, sob marquises, que toma álcool puro, que abandonaram tudo sem saber que são vítimas de doença, os que se internam nas favelas em busca das pedras malditas, os que estão a um passo do suicídio, do crime, do fim de tudo sem nunca terem sentido o gosto da vida. Olha e queria ter o poder de saber ao certo qual é a palavra, a chave. Descobre que a vida é assim mesmo. Por isso é preciso continuar falando, escrevendo, gritando, não desistindo. Porque é possível.