15:38Luz pela garganta

de Ticiana Vasconcelos Silva

Ela resolveu começar a viver aos quarenta anos. Até então, pensara, sonhara, tentara entender algo. Visto que não havia entendido qualquer coisa durante as quatro décadas, resolvera dar uma chance a si mesma e ao pouco que sabia da vida. Começou a cozinhar, por exemplo, já tarde, porém ainda com esperança de criança. Todos os medos e fantasmas a controlaram por anos a fio como em um filme de terror cheio de efeitos especiais para impressionar mais pelas imagens do que pelo conteúdo. A única grande lição que ficara, no entanto, era a de que não se arrependera de nada. Afinal, a vida se inicia hoje. Ficaram cicatrizes das tentativas suicidas dos amores platônicos, dos empregos mal sucedidos, das intolerâncias diante de um pensamento singular que ela nutria ao ler e escrever poesias diariamente. Ela pensava em tudo e via a vida com uma característica de personalidade que a deixava ao mesmo tempo impassível e atônita. Para ela, um show de horrores que a convencia de que não valia a pena. Mas, um belo dia, percebeu a miríade de imagens na cabeça. Tudo inventado para dar emoção aos dias comuns. E como num passe de mágica, caiu em si. Quebrou o dente da frente para permitir que a luz entrasse pela garganta e ela expressasse o seu amor. Pela vida.

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