19:10ZÉ DA SILVA

A cruz no topo da torre da igreja é de neon. Sou ateu, mas sempre fico olhando-a de madrugada da janela de casa. Procurei o Pai Nosso que estás no Google numa noite de insonia e de solidão massacrante. Faz sentido? Sem pensar muito, durante o dia fui até a calçada em frente a outra igreja, a dos Capuchinhos. Um velho frade estava na porta. Olhei as sandálias da humildade e disse que queria me confessar. Ele perguntou se eu era casado. Eu disse que sim. Lá dentro a primeira e única confissão que fiz foi a de que menti para ele, pois era divorciado. Saí sem tempo de olhar novamente o altar e a cruz com o Cristo pregado. Não sei o que anda acontecendo comigo. Hoje chorei enquanto dirigia o carro velho e me escondia atrás de um óculos bem escuro. Pensei em mãe e pai que se foram há muito. Agradeci ter recebido a vida, mas não sei direito o que é isso. Desconfio que estou descobrindo o que chamam de alma. Talvez por isso tenha feito vários sinais da cruz. Quem estava no carro ao lado, no sinal fechado de um cruzamento, não deve ter entendido. Estou pagando a dívida.

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