7:57Duas entrevistas esclarecedores

por Ivan Schmidt

 

Duas entrevistas marcaram o fim da semana passada e o início desta: a do sociólogo Francisco de Oliveira, publicada na Folha de S. Paulo do último sábado, e a do jornalista e escritor Cid Benjamin no programa Roda Viva de segunda-feira na E-Paraná. Duas oportunidades em que o raciocínio lúcido e extraordinariamente bem colocado por ambos os entrevistados concedeu a leitores e telespectadores aulas magnas sobre o cenário atual da política brasileira, especialmente na fase dos governos do Partido dos Trabalhadores.

Ambos falaram na condição de ex-defensores entusiasmados de Lula e do petismo em geral, mas que com o passar do tempo e pela observação chocante dos desvios ideológicos e, pior, da prática antes condenada nos demais partidos, resolveram se retirar do acampamento do antigo metalúrgico por não aceitarem manchar sua reputação de agentes e pensadores políticos, cuja história e respeitabilidade valem muito mais que os afagos do poder conquistado com base em quimeras ou falaciosas promessas de palanque.

Aliás, um efeito colateral dessa enxúndia mórbida que atacou o governo petista, pipocou no meio da semana quando o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, anunciou o pedido de prisão imediata dos condenados do mensalão, mesmo daqueles com direito a novo julgamento, entre os quais o comissário José Dirceu (de férias no litoral baiano) e o prestidigitador Marcos Valério.

A petição foi acatada e resolvida pela Suprema Corte na sessão de quarta-feira, decidindo os ministros após intenso debate que os condenados devem começar a cumprir as penas imediatamente.

A essa altura do campeonato, passados oito anos e meio daquilo que o presidente Lula reconheceu como algo “que todo partido fazia”, nenhuma satisfação será melhor acolhida pela sociedade senão o cumprimento incontinente das ordens de prisão. Trata-se de uma reparação tardia ao escárnio imposto a milhões de cidadãos brasileiros, que trabalham de manhã à noite para abarrotar os cofres públicos. E para que ninguém diga que aos acusados não se concedeu a plenitude do direito de defesa, basta lembrar que na verdade chegou-se ao cúmulo de caracterizar, em determinados momentos do julgamento, uma inegável simpatia ministerial em relação a alguns dos réus.

Tanto Francisco de Oliveira quanto Cid Benjamin, o primeiro com larga folha de serviços em prol do socialismo e da igualdade, fiel escudeiro de Celso Furtado desde os tempos da Sudene e do Ministério do Planejamento no governo João Goulart, e anos depois uma das mentes mais brilhantes do Cebrap, celeiro do apogeu da sociologia brasileira. Em relação a Dilma, o professor emérito da USP, afirmou tratar-se de “uma personagem trágica” que deu uma “resposta idiota” às manifestações de junho, e que “Lula está fazendo um trabalho sujo”. As formulações entre aspas estão na matéria assinada pelo repórter Ricardo Mendonça, e até o momento em que escrevo não foram contestadas pelo entrevistado, assim como não houve qualquer manifestação dos bonifrates a serviço do circuito de poder da República.

Benjamin foi militante da esquerda e da luta armada nos anos 60 e 70 integrando o MR 8, sendo preso e exilado para a Argélia e Suécia. Ao voltar trabalhou no Globo no qual ganhou o prêmio Esso com uma série de reportagens sobre a guerrilha do Araguaia. Depois, no Jornal do Brasil, realizou proficiente investigação sobre a morte do então prefeito de Santo André, Celso Daniel, concordando com a tese do Ministério Público de que ele teria sido morto pela máfia do transporte coletivo atuante no município e corruptora de funcionários públicos. “Não creio que o Celso foi assassinado por alguém do PT, mas estou certo que foi vítima da corrupção”, afirmou.

A desistência do PT e a opção pelo PSOL, segundo Cid, lhe permitiu prosseguir no ofício de pensar e escrever sobre a ciência política, difundindo as ideias que sempre defendeu e que não mais encontravam eco ou razão de ser num ambiente partidário dominado por interesses diversos. A seu ver, a eleição de Lula foi um desastre para o país e seus dois mandatos, substituído agora por Dilma Rousseff, simplesmente “mostram que eles foram incapazes de fazer nada mais relevante que os demais presidentes fizeram desde José Sarney”.

É proverbial a concordância de Chico de Oliveira quanto ao conservadorismo de Lula desde a época de líder sindical até chegar à presidência da República: “Na presidência atuou como conservador. Pôs Dilma como uma expressão conservadora. Você não vende uma personalidade pública como gerente. Gerente é o antípoda da rebeldia. Ele a vendeu como a gerentona que sabe administrar. É péssimo. O Brasil precisa de políticos com capacidade de expressar essa transformação e dar um passo a frente. Não se pode nem ter uma avaliação mais séria dela, pois ele não a deixa governar. Atrapalha, se mete, inventa que é o interlocutor. Ela não pode nem reclamar. É uma cria dele, né?”.

Benjamin afirmou que os governos petistas são cópias mais ou menos idênticas dos governos anteriores. Oliveira reclama mais atenção ao social, apontando o Bolsa Família “como uma declaração de fracasso”, lembrando que o programa “atende uma dimensão da miséria, mas sem promessa de transformação”. É isso.

 

 

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4 ideias sobre “Duas entrevistas esclarecedores

  1. Emerson Paranhos

    Juro que eu queria ficar calado ante tanta soberba e mentira deste tal de Francisco Oliveira – que serviços ele prestou ao Brasil??? a não ser a sociologia da mentira e da falsidade. Mas, deixaria isto por conta da mediocridade dos atuais “pensadores” e articulistas, se não fosse frase do texto do sociólogo maganão, mistura de coisa nenhuma como o que não presta. Ele afirma claramente nessa entrevista, pela primeira vez as claras, a DIVISÃO DO TERRITÓRIO BRASILEIRO em nações indigenas. Ele pelo menos tem a honestidade de afirmar claramente o que os sociólogos lesa pátria- aqueles que somente viram indios em filmes- afirmam em particular. Não passam de servidores da casa dos Windsors, na defesa do nióbio e outras riquezas para o capital transnacional. E, pior se continuar o andar da carruagem com o s atuais banas no poder não demoram a atingir seus objetivos.

  2. antonio carlos

    Estou até com pena do sociólogo e do jornalista, saíram desiludidos do pestismo , e o jornalista optou pelo radicalismo socialista. Mas não discuto gosto ou mau gosto de ninguém. E este chororô de que o pestismo não é mais o mesmo não desde que se apossou do poder é conserva mais do que fiada, todos os partidos são iguais, até não chegarem ao poder. Depois é tudo a mesma coisa, adeus ideologia. Se um dia, Deus nos livre, tivermos um partido socialista no poder não dura um mandato, fica igual ao neoliberalismo tucano.

  3. Célio Heitor Guimarães

    Um trio da pesada neste dia da República, Grande Zé: Francisco, Benjamin e Ivan. Ainda há vida inteligente e esperança, como escrevi ontem aqui, neste mundo abarrotado de patifes e idiotas.

  4. Emerson Paranhos

    Vi o Roda Viva do Sr Cid Benjamin. Engraçado hoje ele é democrata, crê no pluripartidarismo e com restrição a favor da anistia. Como está bonzinho o “intelectual”. Defende Cuba e diz da condições de outras republicas do Caribe. Como sempre ou está mal informado ou usa de má fé. Quem está muito mal no Caribe é o HAITI e CUBA. Fala da taxa de analfabetismo em CUBA e do sucesso da ilha nos jogos olímpicos. Aconselho ao cidadão consultar os resultados dos jogos antes do Ditador sanguinário, mestre eterno da escuridão e dos anos de chumbo naquela ilha e hoje traficante de escravos. Se informar é bom!!!! – ele vai saber que Cuba sempre foi destaque nos jogos e a taxa de analfabetismo anterior era pequena.
    Outra coisa, fala com orgulho e soberba do sequestro do embaixador – assim como tortura de qualquer espécie é crime hediondo, o que concordo- SEQUESTRO É CRIME HEDIONDO É TORTURA – dar porrada em embaixadoR também é.
    Como não foram julgados por isso – VAMOS REVOGAR A ANISTIA E TIRAR ESTA HISTÓRIA A LIMPO TAMBÉM. Como diz ele apenas para fazer as pazes com a história.

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