7:42Volta, Francisco!

por Célio Heitor Guimarães

 

Como é que os cariocas, tão hábeis na hospitalidade e nos protestos de rua, foram capazes de deixar o Papa – ou “Papo”, como diria a “presidenta”, tão preocupada com o gênero dos cargos – ir embora? Não se dispensa tão facilmente assim um argentino que reconhece que Deus é brasileiro e não mora em São Bernardo do Campo nem no Bigorrilho, em Curitiba.

 

Em uma semana no Brasil, Francisco foi capaz do milagre da paz, união, fraternidade, alegria e esperança. Falou em português e em espanhol e foi ouvido e entendido por suecos, alemães, poloneses e africanos.

 

A chegada foi marcada pela trapalhada da organização, que engarrafou o Fiat do doce pontífice na Av. Getúlio Vargas. Mas ele achou ótimo. Pôde achegarse mais perto da população. E fez questão de manter aberta a janela do carro, assim como mandou tirar os vidros laterais do papamóvel. “Como eu poderia usar um carro fechado ou cercado de vidros se vim aqui para me aproximar do povo?” – teria justificado, com candura. E se aproximar das pessoas foi o que ele mais fez. Cumprimentou-as, abraçou-as e beijou-as. Coisas que nunca aconteceram antes e até são proibidas pelo protoloco do Vaticano. Mas Francisco recebeu e distribuiu carinho. Até goles de chimarrão aceitou tomar em plena via pública, servido por desconhecidos, deixando a segurança em pânico.

 

Fez mais. Muito mais: já na recepção deu uma aula de educação e despojamento à companheira Dilma, a quem, é sabido, preferia não ter encontrado, posto que se dizia no Brasil em missão apostólica e não como chefe de Estado. Falou pouco, apenas o suficiente, com seu estilo gentil, como um amigo que desembarcava em terra amiga. Dilma, ao contrário, empertigada, mas visivelmente desajeitada diante de tamanha simplicidade, valeu-se dos velhos chavões lulo-petistas, enaltecendo as realizações de seu governo e quase se apresentou como responsável pela opção do Papa pelos humildes. Felizmente, as ditas autoridades logo foram arredadas. Até porque ficaram sabendo, desde logo, que o visitante não trazia ouro nem prata, mas apenas a palavra de Jesus Cristo. E Jesus Cristo é o que menos lhes interessa.

 

Mais tarde, ficaram sabendo, como todo o mundo, que Francisco não trazia apenas a palavra de Cristo, mas afirmações de uma Igreja em fase de pré-reconstrução, que dá força aos jovens, pede respeito aos velhos, preocupa-se com os pobres e excluídos, combate a desigualdade, a ambição e a corrupção, critica o racismo e é capaz de apontar a “incoerência”, a “omissão” e a “falta de humildade” da própria instituição milenar, tão cheia de pompa, dogmas e egoísmo, mas incapaz de se aproximar do povo.

 

-– Infelizmente, ganhou espaço a cultura da exclusão, a cultura do descartável. Não há lugar para o idoso e para o filho indesejado. Não há tempo para se deter com o pobre caído à margem da estrada” – diagnosticou o Papa para o clérigo na Catedral Metropolitana do Rio.

 

Se há alguém capaz de sacudir a Igreja Católica, esse alguém é o argentino Jorge Mario Bergoglio. A começar pelo próprio exemplo. Não duvidem dele. Com sua voz macia e doçura no olhar, ele é capaz de apontar os pecados e os crimes da Cúria Romana, chamar à razão padres, bispos e cardeais que se encantam com o poder, com o luxo e grifes, mas se afastam das ruas, das pessoas e dos necessitados; e exortar os jovens a se tornarem “re-vo-lu-cio-ná-ri-os”, mas diz ser incapaz de julgar os homossexuais.

 

-– Se uma pessoa é gay e procura Deus, quem sou eu para julgá-la? – respondeu Francisco a uma indagação da jornalista Ilze Scamparini, a bordo do avião que o levava de volta à Roma.

 

Jamais imaginei ouvir um Papa, ocupante do trono de Pedro e a quem se chama Santo Padre, dizer isso. E com uma simplicidade e honestidade desconcertantes. Precisamos preservar este homem!

 

Assim, se não for possível trazer Francisco de volta, ao menos atendamos ao seu pedido: rezemos por ele. Ele merece e precisa.

 

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3 ideias sobre “Volta, Francisco!

  1. antonio carlos

    Caro Hélio, você disse tudo, tirou as palavras da minha boca. E não estou sendo modesto não, disse para a minha mulher, foi só o Papa cair fora que Pindorama voltou à rotina. Será que aguentamos tanta bandalheira até 2017? Tenho fortes dúvidas de que Deus seja brasileiro, sei que santo de casa não faz milagres e etc e tal, mas se ele fosse mesmo brasileiro não deixaria que sofrêssemos na mão de tanto vagabundo .

  2. PAULO SERGIO MOREIRA

    Esse do Bigorrilho vem a ser o inquilino da casa n. 220 na rua Frederico Cantarelli ?

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