Da coluna Blogs do Além, de Vitor Knijnik, publicada na revista Carta Capital:
Blog da GARBO
A ÚLTIMA ENTREVISTA
Grande parte do meu mito foi construído através do silêncio. A recusa em partilhar minha vida íntima com o público e com a imprensa criou uma aura de mistério em torno de meu nome. Foi algo involuntário. Quanto mais reclusa eu ficava, mais aumentava o meu mito. Eu era uma Susana Vieira às avessas.
Imaginem que arrebatei as plateias entre os anos 20 e 40. E mesmo naquela época, sem Google Maps, sites de fofocas e câmeras em celulares, tive que trocar de casa 11 vezes para não ser incomodada e usar muitos nomes falsos quando dava minhas voltinhas. Harried Brown era meu codinome favorito. Hoje seria Beija-flor. Adoro Cazuza. Mas o que eu dizia? Ah, sobre meu comportamento reservado. Bom, eu não frequentava festas e não ia aos lançamentos dos meus próprios filmes. Nem o Oscar que ganhei, pelo conjunto de minha carreira, eu fui buscar.
Quero deixar claro que não considero o jeito reservado de viver moralmente superior. Cada um sabe o que é melhor para si. Eu simplesmente achei que era possível trabalhar na frente das câmeras e ter uma vida íntima preservada, como qualquer outro profissional. Nunca entendi porque artistas são convidados a dar sua opinião sobre tudo. Há, claro, entre nós aqueles que são cultíssimos e informados o suficiente para palpitar sobre qualquer assunto. Mas a maioria, a qual pertenço, não tem lá muito o que dizer além de trivialidades. Razão pela qual dei só 14 entrevistas durante a vida. Número que o Latino alcança em duas horas, quando sobe um vídeo novo no Youtube. A última vez que concedi uma entrevista foi em 1928. E olha que passei desta para você sabe a onde (não vou dizer melhor nem pior para preservar a minha intimidade) só em 1990.
Mas a vida também é feita de concessões. Para atendar aos muitos pedidos, para saciar a curiosidade de milhões de fãs e para ver se finalmente vocês me deixam em paz, decidi conceder uma última e derradeira entrevista. Eu mesmo encarreguei-me de formular as perguntas e as respondi por email. Mesclei assuntos varados para tentar contemplar o gosto de todos. Confira.
P: A Seleção Brasileira tem obrigação de ganhar a Copa das Confederações?
GG: Existe este torneio?
P: Você acredita que as medidas de austeridade tirarão a Europa da recessão?
GG: Vamos ver.
P: Agora vamos falar da Greta. Como você concilia o seu lado mãe, mulher e atriz?
GG: Conciliando.
P: Como você relaxa do stress?
GG: Dormindo.
P: Como foi pra você representar tantas mulheres marcantes?
GG: Normal.
P: O que você diria para uma jovem que está começando sua carreira de atriz agora?
GG: Oi.
GG: Era isso?
P: Sim.
P: Obrigada.
GG: De nada.
Ainda que ficção, seria o modelo ideal de entrevista: racional e concisa, ninguém ia exergar nada nas entrelinhas.