de José Maria Correia
CORPUS CHRISTI é o dia sagrado da celebração do corpo de Cristo como redivivo, mas também do nosso próprio corpo profano como milagre prodigioso, fenômeno maior da natureza.
Meu pobre irmão corpo, como o denominava o santo da ecologia, São Francisco de Assis, parece extenuado de carregar o espírito por mais de sessenta anos.
O cavalo, como é chamado nos cultos afros, vem cavalgando por estepes cobertas pelas geadas, desertos, montanhas, vales e pradarias sem descanso apesar de muito fustigado.
Atravessamos, nessas décadas, rios que nem mais existem e desapareceram dos mapas para permanecer na nossa memória afetiva.
Quanto veneno tem recebido esse irmão corpo e quantos maus tratos – e ainda assim prossegue quando tantos ao seu lado já deitaram para sucumbir.
Meu irmão corpo tem sido um cavalo de guerra, não formoso como o mitológico Bucéfalo de Alexandre, nem cultuado em lendas como o Babieca de El Cid Campeador.
Andamos extenuados dos combates e já carregamos o arado. Muito mourejamos, mas não nos adaptamos aos arreios.
Eu, espírito inquieto, ele só coração, mente e bravura.
Tivesse meu cavalo um nome literato seria Rocinante, o companheiro de Dom Quixote, o cavaleiro da triste figura.
Digo porque, também acometido da mesma ilusão de mudar o mundo, o levei a combate moinhos de vento.
E juntos andamos nos desviando, como nos salmos das setas noturnas dos inimigos.
Tantas vezes nos desviamos quanto as que fomos atingidos.
“Bien podran los encantadores quitarme la ventura , pero el ezfuerzo y el ánimo será impossible” (Quijote)
Como nos versos de Vinicius, nos lançamos por desconhecidos mares afora, vimos sóis nascer e vimos morrer auroras.
Andamos a contemplar os campos floridos de papoulas e girassóis, e mergulhamos em cinzas penumbras e rubras alcovas.
Mas também depois de quase mortos em noites intermináveis, ressuscitamos em manhãs radiantes reacometidos da esperança demencial que nos alimenta como uma miragem, um arco-íris, um caminho de lugar nenhum.
Eu, o espírito e o cavalo, viemos em solidão ao mundo quando deixamos em vagidos de desespero o paraíso do ventre materno para nunca mais retornar.
E nós dois, juntos, aprendemos a nos bastar, embora nos mova sempre a busca do encontro como a arte da vida, apesar de tantos desencontros.
E é assim que temos sobrevivido, mais do que vivido. Eu, este ser imaterial, conjunto de angústias e procuras, pleno de incompletudes, e o meu irmão corpo a somatizar minhas dores da alma.
É este irmão que me transporta por caminhos insondáveis sem tremer, até o dia em que a pira incandescente já encomendada, e tantas vezes adiada, se acenda em definitivo e o calor sagrado nos extermine como dois que temos sido e nos unifique imateriais para que nossa irmandade se encerre na paz do eterno.
Como diria o Gordo, do Bamerindus: Esse Zé Maria…
Quem não gostar/ou é muié do padre.
Me parece que escreveu a duas mãos, a outra, a do Jamil Snege.
José Maria, saiba de uma vez por todas: seus textos são indispensáveis e imperdíveis. Pena que bissextos. Esse espaço comandado pelo bravo Zebeto, a meu ver, uma festa à inteligência, se enriquece a cada vez que você comparece! Não fosse pela extrema cafonice eu lhe diria: “Apareça”…
Concordo com o Ivan Schimidt e emendo….onde está o prometido livro com as histórias de Curitiba?
Obrigado aos amigos , digo ao Ivan que as visitas da musa também são bisextas JM