6:26Ainda e sempre Chico Anysio

por Ivan Lessa*

Antes de mais nada, como todo mundo, lamentar a morte do esplêndido Chico Anysio.

Não fossem aqueles que nos fazem rir e estaríamos todos um pouquinho pior nesta chatice de vida.

O humorista Robert Benchley, de saudosa e esquecida memória, escreveu de certa feita numa de suas antológicas colaborações para a revista New Yorker, quando esta ainda se achava em uma de suas fases gloriosas, que “quando morre um humorista a única coisa a fazer é entrar no primeiro botequim e beber até cair no chão”.

Depois noticiar direitinho quem era o tipo e o que fez.

Nossa imprensa, pelo que acompanhei na internet, fez o que podia e mais um pouco.

Pena que, de registro, apenas o Chico da Globo.

Não consegui um clipe das personagens pré-globais. Todas em branco e preto. Acho que eram para a TV Rio, mas não juro.

Nada do compositor popular, do Alfacinha, daquele garçom fanho e mais algumas dezenas de tipos.

Foi o único ator comediante que me fez rir no Brasil. Papa fina. Quando o Pasquim, através de sua editora, a Codecri, publicou umas coisas dele, foi uma glória e um desapontamento para o Chico: contas mal prestadas, má distribuição, a eterna pasquinagem.

Não guardou rancores, tudo bem com ele e aqueles que só os muitos desavisados chamavam de “patota”, para grande divertimento dos que faziam o jornaleco.

Chico era um “labóratra”, para não usar a expressão corrente em nossas terras que é workaholic. Brincava, quase que literalmente nas 11, ou, para ser mais preciso, nas suas 207 criações, pelo menos umas 197 delas antológicas e que – vem, lugar-comum, vem e me leva contigo – deverão viver para sempre graças ao milagre da tecnologia.

Ficarei sentindo a falta daquela turma em branco e preto que era um dos poucos motivos que me deixava em casa pelos arredores do aparelho de televisão.

Uma coisa que também senti falta, foi ninguém mencionar o Chico Anysio compositor, letrista, a bem da verdade, que de letras era homem, tanto é que nunca foi convidado para botar fardão e empunhar a espadinha da Academia Brasileira de Letras.

Na verdade não teve interesse em gozar aquilo que já é piada, e piada de péssimo gosto. Tenho guardadinho, graças ao YouTube (VocêTuba?), o Rio Antigo, composto em parceria com o Nonato Buzar e na gravação da formidável Alcione.

Nunca ouvi, e ouço sempre, sem deixar de sentir um nó na garganta e um ardor nos olhos (em certos casos, a perda de um humorista provoca não o porre mas um jorro incessante de frases feitas). Tenho a impressão de que era muito Chico Anysio demais para apenas 300 milhões de habitantes.

Dito isso, e em memória de grandes papos aqui (redação do Pasquim) e ali (butecos, esquina, corredores da Globo), não queria deixar de assinalar que a morte de Chico Anysio deu ensejo ao que seguramente podemos colocar em uma lista com as 10 melhores primeiras páginas de nossa história jornalística, a saber, quem diria, no jornal carioca O Dia, que fez algo simples e (nesse caso a palavra cabe mesmo) genial. Cercada por todos os lados com pequenas fotos das criações do homem, a manchete em letras garrafais, “Morreram Chico Anysio”.

De vez em quando, caso do Chico e do jornal, esbarramos frontalmente com a grandeza. Pena que seja em horas tristes e com tamanha escassez.

* Colunista da BBC Brasil

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2 ideias sobre “Ainda e sempre Chico Anysio

  1. Parreiras Rodrigues

    Chico não morreu.

    A gente toda hora o encontra num buteco da Trajano Reis, numa esquina qualquer da Murici, na entrada da missa na Guadalupe, no velório dum compadre, num companheiro de trajeto do Inter 1, num banco da Carlos Gomes, na festa da Uva em Santa…

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