de Manoel Carlos Karam
Percorri o museu em busca do quadro que retratava umacena famosa da guerra contra os taedos. Recordo com 85% de nitidez que perguntei para um guarda onde estava o quadro. Lembro com 85% de itidez que ele me deu uma indicação 100% precisa. Parei diante do quadro com os olhos de quem olhava para o espelho sobre a pia do banheiro. O quadro: oito canos de fuzil saíam de dentro de uma trincheira feita de lama, somente os oito canos, não eram vistos os oito gatilhos, as oito culatras, os oito soldados — oito canos de fuzil saíam de dentro de uma dramática trincheira feita de lama. Ou, como preferiria o nosso herói, 8 canos de fuzil sem 8 gatilhos e sem 8 culatras e sem 8 soldados, 8 canos de fuzil, o número para que as aulas de matemática fiquem definitivamente sepultadas na lama da trincheira. 8 soldados precavidos expondo apenas os 8 canos de fuzil, sem possibilidade de pôr em prática os ensinamentos a respeito de pontaria, mas o acaso levaria as balas diretamente para o alvo, o peito dos filhos da puta dos taedos. Acaso ou Deus, dependendo dos interesses de cada um. O quadro não mostrava como os nossos soldados eram valentes, mostrava como eram precavidos, e exibia a altíssima qualidade dos canos dos nossos fuzis. Uma guerra com tamanha precaução, já que a precaução era tomada nos dois lados, tinha imensas possibilidades de terminar empatada. Talvez tenha sido isto o que transformou o quadro numa obra famosa. Ah, ia me esquecendo, o quadro tinha nome: Jornal da guerra contra os taedos. E, ia me esquecendo também, tinha autor: soldado desconhecido. De que me adiantava o quadro sem rostos? Pobre caçador de traços faciais, aquele quadro era inútil. A não ser que
Caro Zé.
Acompanho todos os dias. Voce é um amigão.
Grande abraço.