por Zé da Silva
Capricórnio
Vermes são assim. Comem a alma do outro. Ele pensou nisso, mas o que estava sendo comido era seu corpo. Ou não? Morreu? Não morreu? Se tinha lembrança do velório e dos chumaços de algodão a bloquear a entrada das narinas… Não sentia dor, nem pânico, nada. Vermes são assim. Mas naquela outra vida, a de carne e osso, suor e sangue,ele sentiu dor. Traição, desonestidade, falsidade, tudo em corpos de seres que se diziam gente, se perfumavam e vestiam roupas bacanas. E trucidavam feito… feito vermes, os outros, os que acreditavam no tal do amor. Será que consigo enxergar estes daqui, que estão a se alimentar da minha carne? Sim. Milhões deles. Mas tão inofensivos. Trabalhando sagradamente, como manda a Natureza, que também pode ser chamada de Deus. Já tinha ficado só no osso e os bichinhos tinham ido embora. Continuava pensando nos outros vermes. Teve vontade de sair dali (e ele não sabia onde estava), para promover a morte dos vermes do mundo. Mas ficou. Daquele jeito. Para sempre. Esperando, quem sabe, que algo lhe informasse que uma onda de bondade tinha varrido da face da terra aqueles seres tão famintos.