Da coluna de Mônica Bergamo, na Folha.com:
TORPEDOS PELO CELULAR
O escritor Fernando Morais e o embaixador da Venezuela no Brasil, Maximilien Arvelaiz, acabam de fazer discurso em homenagem ao ex-secretário-geral do Itamaraty, Samuel Pinheiro Guimarães, num jantar que ofereceram a ele na sexta, em São Paulo. O diplomata pede a palavra.
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Apontado como figura central no governo do ex-presidente Lula, “num tempo em que, como dizia Chico Buarque, o Brasil deixou de falar grosso com os vizinhos e de falar fino com os EUA”, segundo Morais, Guimarães agradece ao escritor, anfitrião do encontro.
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E reverte a homenagem. “Sinto-me emocionado. No entanto, entre nós aqui há quem tenha lutado com mais vigor e com mais sofrimento para diminuir as nossas inaceitáveis desigualdades. Sofreram. E ainda sofrem. Não preciso citar nomes.”
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A plateia –entre outros, a atriz Letícia Sabatella e o produtor de cinema Luiz Carlos Barreto– se vira na direção de José Dirceu. O ex-ministro da Casa Civil do governo Lula esboça um sorriso. Está ainda mais magro e com os cabelos mais compridos do que o habitual. Hoje, ele começa a ser julgado pelo STF (Supremo Tribunal Federal). É possível que seja condenado e até preso.
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“As classes tradicionais –ou, se preferirem, retrógradas, reacionárias– nunca vão aceitar que um nordestino [Lula] tenha se transformado em um líder respeitado e reconhecido internacionalmente. É disso que se trata. É isso o que estamos vendo”, disse Guimarães, no que foi entendido como uma referência ao julgamento do mensalão e de Dirceu.
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“Nunca vão aceitar que esse operário tomou o poder”, diz o diplomata. “Ou melhor, tomou uma parte do poder do Estado. Não todo. Não tenhamos ilusão. Vivemos numa plutocracia, que precisa virar uma verdadeira democracia.”
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Depois do discurso de Guimarães, os convidados começam a jantar. Enquanto todos comem, Dirceu fala ao telefone. Ou dispara torpedos freneticamente pelo celular.
Poderia ser um equívoco, devido a incapacidade de compreender o sentido de uma verdadeira democracia. Poderia ser a ingenuidade que com freqüência acompanha a utopia revolucionária. Mas infelizmente não o é! Quando um ex-embaixador, inteligente e articulado, atribui o julgamento de crimes de formação de quadrilha, de pura ladroagem do dinheiro público à ação de “classes tradicionais … retrógradas, reacionárias”, percebe-se que ainda há uma esquerda política brasileira que é atrasada e mal intencionada ao tentar confundir o público com falácias maniqueistas. Ainda bem que já há setores da esquerda política brasileira que abominam Zé Dirceu e sua quadrilha de 40 ladrões!
E quem fará o desagravo aos brasileiros pela roubalheira dos mensaleiros?