16:02Os acumuladores compulsivos de Curitiba

Da assessoria de imprensa da Universidade Federal do Paraná, em reportagem de Jéssica Tokarki 

Estudo inédito de doutoranda da UFPR mapeia casos de acumulação compulsiva em Curitiba 

A maior parte das pessoas classificadas como acumuladoras de animais e/ou objetos em Curitiba é formada por mulheres, idosas, com baixa renda e pouca escolaridade e que vivem sozinhas. Os dados fazem parte de um estudo epidemiológico inédito, realizado pela doutoranda Graziela Ribeiro da Cunha, do Programa de Pós-Graduação em Ciências Veterinárias da UFPR, em parceria com as secretarias municipais da Saúde, Meio Ambiente e Assistência Social. O trabalho serve de base para a elaboração de um guia destinado a capacitar profissionais do serviço público para o atendimento de acumuladores.

O acúmulo compulsivo é uma dificuldade persistente de se desfazer de objetos ou animais, independente de seu valor real. Ele pode representar um grave problema de saúde pública, colocando em risco a saúde, a segurança e o bem-estar dos envolvidos e da comunidade em seu entorno.

“A acumulação compulsiva é movida por uma necessidade de salvar os animais ou objetos e angústia em separar-se deles”, explica Graziela. “O acúmulo congestiona e obstrui áreas de convivência internas e externas, ameaçando toda a comunidade devido ao risco de desabamentos, incêndios e problemas de ordem sanitária. Os casos de acúmulo compulsivo que envolvem animais são também caracterizados pela incapacidade de fornecer os padrões mínimo de saneamento, espaço, alimentação e cuidados veterinários.”

O estudo compilou e analisou denúncias a respeito de acumuladores de animais e/ou objetos recebidas pelas secretarias de Meio Ambiente, Saúde e Assistência Social de Curitiba no período de setembro de 2013 a abril de 2015. Foram confirmados 113 casos, dos quais 69 foram completamente avaliados. Desses, 62,32% envolviam mulheres e 37,68%, homens. A idade dos acumuladores variou de 33 a 84 anos, mas a maior parte (57,97%) são idosos. Grande parte deles (76,81%) relatou problemas de saúde.

Outras características predominantes: 63,76% dos acumuladores estudaram até o ensino médio; 50,72% recebiam até um salário mínimo por mês e 39,13%disseram que viviam sozinhos.

O estudo também constatou que em 88,4% dos casos havia no ambiente risco de proliferação de vetores e em 65,21% havia odor desagradável no local.  Risco de incêndio e desabamento foi relatado em 34,78% dos casos e de desabamento, em 13,04%.

Em relação à localização, o estudo revelou maior concentração de casos na região norte da cidade – mas, como é uma região mais urbanizada, existe a suspeita de que pode na verdade ter havido mais denúncias nessa região.

Protocolo

O levantamento de dados realizado para o estudo tem o objetivo de obter subsídios para o estabelecimento de um protocolo de atenção específico, multidisciplinar e intersetorial para a abordagem dos casos. “O mapeamento permitiu a identificação de áreas consideradas prioritárias para a aplicação das estratégias de intervenção pelo poder público, além da criação do grupo de trabalho que contribuiu na difusão do conhecimento sobre o tema”, comenta Graziela. Ela ressalta a importância da participação de profissionais médicos veterinários como parte desse grupo de trabalho.

O projeto resultou no desenvolvimento do “Guia de Orientação – Abordagem de indivíduos com comportamento de Acumulação de objetos e/ou animais”, material que está em fase final de elaboração e deverá ser lançado em breve. Trata-se de um guia realizado em parceria com a Prefeitura de Curitiba e que propõe as bases para a criação de uma Linha de Cuidado aos indivíduos que apresentam o comportamento de acumulação compulsiva. “A complexidade e gravidade dos casos exige a implementação de ações específicas e um plano de cuidado integral para a condução dos casos sob uma perspectiva de saúde única, ou seja, da saúde humana, animal e ambiental”, explica Graziela.

A problemática desse tipo de acumulação é multidisciplinar e envolve questões sociais, sanitárias e ambientais, causando impacto na saúde das pessoas direta e indiretamente envolvidas, dos animais e do meio ambiente. Nesse sentido, é importante e necessário o envolvimento de profissionais de várias áreas para que possa ser discutido e pensado em um encaminhamento correto para os casos.

A primeira parte do estudo, que contém a frequência e distribuição espacial dos casos, pode ser conferida neste link. A segunda parte, que contém o levantamento das principais características dos casos de acumulação, foi submetida à revista BMC Public Health e está em processo de avaliação editorial.

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