Ilustração de Theo Szczepanski
de Rogério Pereira
— Pra onde você vai?
— Vou pro Suriname, filho.
— Lá é legal, pai?
— Não sei.
— Por que você vai pra lá?
— Também não sei, filha.
— Mas você vai mesmo?
— Vou.
— Por quê?
— Às vezes, é preciso ir pra algum lugar.
— Por que esse tal de Suriname, pai?
— Não sei, filho.
— O que tem lá?
— Acho que tem pouca coisa.
— Então, deve ser bem chato.
— Sei que tem um travesti no Suriname.
— O que é um travesti, pai?
— É um homem que gostaria de ser mulher. Ou uma mulher que não deu muito certo.
— O Suriname é muito longe?
— É bem longe.
— Então, vai demorar pra chegar.
— Mas preciso ir.
— Por quê, pai?
— Não sei, filho. Acho que já deveria ter ido antes.
— Você não gosta mais da gente?
— Isso não tem nada a ver com vocês dois. É uma coisa minha. Eu gosto de vocês.
— Então, não vai pro Suriname.
— Eu preciso ir.
— Por quê, pai?
— Não sei, filho.
— Mas você vai voltar?
— Sim, eu voltarei. É sempre necessário voltar. Não dá para fugir o tempo todo.
— Você está fugindo, pai?
— Acho que estou.
— De quem você está fugindo?
— Não sei, filha. Mas estou fugindo.
— Você vai beber no Suriname, pai?
— Não. Eu nunca mais vou beber em lugar algum.
— Você não gosta mais.
— Gosto, mas não posso.
— Você vai levar a gente pro Suriname depois?
— Acho que sim. Vocês também vão conhecer o Suriname.
— Quando, pai?
— Não sei, filho.
— Quando você vai?
— Eu vou agora. Estou indo.
— Onde fica o Suriname, pai?
— Não sei muito bem. Acho que fica dentro da gente.