7:11Itaipu e o Tratado

A propósito do texto sobre o futuro de Itaipu, publicado aqui ontem, o engenheiro Rogério Piccoli, ex- Superintendente de Administração Financeira e Orçamento, comentou e ampliou a análise sobre o tema. 

Poderíamos escolher dentre as várias expressões chulas existentes e conhecidas por muitos, uma ou algumas que pudessem refletir a importância do tema, ao contrário de todas, sem exceção, que exageram sobremaneira tratar-se de um acontecimento que praticamente ninguém se encontra em condições de resolver a questão, a ponto de se buscar grupos de inteligências inéditas, mesmo que estranhas ao setor envolvido, a custos desnecessários, quando a solução, mesmo que sujeita a prolongadas discussões de parte a parte, não parece ser de difícil consenso nem de estar distante da que efetivamente deva prevalecer, fruto de mútuo entendimento quanto à eventual revisão das bases financeiras do Tratado de ITAIPU.

O texto publicado no blog é muita rico nos detalhes, talvez a melhor de todos que eu li, e produz uma lógica de raciocínio do que poderá ocorrer na administração da binacional com a mudança de governo.

Minha impressão, sem ser simples porém longe de grandes dificuldades, é a de que em duas alternativas, que julgo ser as principais, se concentram a decisão superior a ser respaldada especificamente por ambos os Senhores Presidentes do Brasil e do Paraguai, a qual, obviamente, deverá nortear o sucesso da negociação.

A primeira dessas duas alternativas que vem de encontro ao real objetivo institucional pelo qual foi firmado o Tratado de ITAIPU e que propiciará uma gigantesca redução do valor do custo unitário anual (tarifa) da ITAIPU, em torno de 60% a 65% do praticado atualmente, como forma de reconhecimento ao consumidor de energia elétrica que amortizou a integralidade do investimento feito na construção da usina, profeticamente foi protagonizada, em data de 24.05.1973, pelo então Ministro das Minas e Energia do Brasil, Senhor Antônio Dias Leite Júnior, imediatamente após a assinatura do Tratado, de seus Anexos e Notas Diplomáticas Complementares, quando em Plenário da Câmara de Deputados do Brasil, em exposição sobre o aproveitamento hidrelétrico do Rio Paraná, em todos os seus aspectos, porém, principalmente. no tocante ao panorama econômico do projeto, exposição essa que foi determinante para a aprovação do Projeto de Lei do Setor Elétrico, que se encontrava sendo apreciado e discutido no âmbito do Congresso Nacional e que posteriormente, em data de 05.07.1973, foi convertido na chamada Lei de ITAIPU, de nº 5.899, a qual tornar-se-ia indispensável para a reestruturação do setor de coordenação da política de energia elétrica, em razão da imensa quantidade de energia que viria a ser disponibilizada pela hidrelétrica de ITAIPU, para atendimento da demanda do mercado consumidor nacional.

Pelas próprias palavras do então Senhor Ministro das Minas e Energia, a excepcionalidade de seu real entendimento quanto ao panorama econômico do projeto, o conduziram a expressar-se de forma objetiva e clara de que: ” As regras econômicas do Tratado e de seus Anexos são todas voltadas para que se consiga obter, do lado econômico-financeiro, um custo extremamente favorável. Essa usina de ITAIPU é um empreendimento isolado, não repetitivo. A entidade ITAIPU fará uma usina e ficará operando-a pelo resto da vida. Não vai fazer outra, nem haverá uso para acumulação de dinheiro ou de reservas dentro da própria entidade. Ela terá de vender energia pelo preço de custo, definido este como encargos financeiros, despesas de operação e dividendos razoáveis a cada um dos participantes, além dos royalties aos dois países pelo uso do bem, do recurso natural. Esse custo, então, sofre dois degraus. Nos primeiros vinte anos, quando estaremos pagando os financiamentos, o valor dessa energia será superior àquele do término do pagamento das dívidas externas, uma vez que o degrau das despesas decai. O preço é feito exatamente em função das despesas. A entidade não vai dar resultado além dos dividendos dos acionistas, que são as duas companhias de eletricidade, Eletrobras e Ande. Serão vinte anos com um preço muito bom e os vinte anos subsequentes com preço excepcionalmente bom.”

Como se depreende, tais palavras sintetizam uma solução econômica muito simples e conforme com os dispositivos institucionais prevalentes do Tratado, sem necessidade de se alterar o Anexo “C” do Tratado, no tocante às suas bases econômicas.

Em relação à segunda alternativa, a qual manteria o valor do custo unitário anual (tarifa) da ITAIPU muito próximo ao atualmente praticado, seria implementado mediante a atualização do “Capital” da ITAIPU, limitado seu valor ao total contabilizado da rubrica “Imobilizado”, utilizando-se para sua integralização, o montante do “Resultado Acumulado de Exercícios Anteriores”, que seria apropriado na conta “Patrimônio Líquido”, com a consequente necessidade de modificações nas Demonstrações Contábeis da ITAIPU.

A alteração necessária, por tal alternativa, seria na redação do Artigo 6º do Estatuto (Anexo “A”) e não no Anexo “C” do Tratado, que viabilizaria a disponibilidade de recursos financeiros adicionais anuais da ordem de US$ 1 bilhão para cada uma das Altas Partes Contratantes, cujo montante seria administrado direta e exclusivamente por cada um dos países, pelo fato de tal disponibilidade passar a se constituir numa receita orçamentária de capital e componente do orçamento anual de ambos os Governos. Paralelamente, face à obtenção desses recursos financeiros adicionais, deve ser deflagrada ação no sentido de dar um fim nos atuais dispêndios denominados “programas sociais”, sem mais nenhuma justificativa de então continuarem existindo, por serem inteiramente estranhos à geração de energia e não contemplados no contexto das disposições do Tratado.

Por fim, a expectativa dessa eventual revisão das bases financeiras do Tratado não deve ficar restrita aos efeitos de uma ou outra das alternativas comentadas, sendo de relevante importância que os atores que estarão à frente das negociações, no caso da Margem Esquerda, terem a sensibilidade de que seja modificada a forma de contratação dos serviços de eletricidade da ITAIPU, adequando-a à realidade, passando a ser através quantidade de energia e não mais de potência, pelo fato de que, sob o critério até então praticado, a Ande subcontrata potência e utiliza a quantidade de energia que lhe é necessária para atendimento de seu mercado, enquanto que a Eletrobras contrata quantidade de potência desproporcional à quantidade de energia que lhe é disponibilizada, caracterizando um subsídio financeiro, arcado por todos nós brasileiros, consumidores de energia elétrica.

A título ilustrativo, tais comentários ora expostos, integram trabalho que estou elaborando e que se encontra quase concluído, para o qual tenho a expectativa de poder apresentá-lo para quem estiver à frente do processo, a fim de que possa ser debatido, na eventualidade de surgir a oportunidade.

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