7:26Concessões à brasileira

por Célio Heitor Guimarães

Como cidadão, em princípio, sou contra a privatização de serviços públicos. Sempre fui. E não se trata de uma decisão ideológica, mas de uma decisão lógica, de pura sensatez. Entidades, organizações ou corporações privadas não têm a menor preocupação com o bem estar da população, com a melhoria das condições de vida do ser humano ou – que vá – com “avanços sociais”. O objetivo delas é um só: ganhar dinheiro, gerar lucro, fechar o ano com enorme superávit. Pode parece que citei três objetivos, mas, na verdade, é um só.

Ah, sim, o governo não tem condições de oferecer certos serviços públicos… Falta-lhe dinheiro e condições gerenciais. Então, a única solução possível é passar tais serviços para a iniciativa privada. Coisas como rodovias, ferrovias, portos, aeroportos, telefonia, exploração mineral e que tais. Então o particular, que tem dinheiro e condições gerenciais, vai lá, se habilita e ganha a concessão para atuar em nome do governo. Pressupõe-se que o interessado tenha, no mínimo, competência e recursos. Certo? Certo coisa nenhuma.

Aqui no Brasil o sistema de concessões é sui-generis. Para dizer o mínimo. O concessionário do serviço público assume a concessão, mas vai logo pedindo e recebendo financiamento do governo para exercer a concessão. Com juros subsidiados, é claro. Quer dizer: o poder público, que não tem condições financeiras para prestar o serviço público, entrega-o para o particular, mas financia aquele exercício que deixou de ter por falta de dinheiro…  Não parece coisa do samba do criolo doido do Stanislaw Ponte Preta?

Mas é a realidade. E a loucura não fica aí. O governo Michel Temer decidiu refazer a licitação de concessões de rodovias e aeroportos realizados na gestão Dilma, cujos contratos não estejam em execução. Esclareça-se que não estão porque boa parte das contratadas foi alcançada pela Operação Lava-Jato e tem os seus principais executivos sob custódia do juiz Sérgio Moro, aqui em Curitiba.

A novidade é que a previsão na licitação é que as antigas concessionárias sejam “indenizadas” pelas novas pelos investimentos já realizados. É o novo modelo de concessão, coordenado pelo ministro Moreira Franco.

E a desculpa chega a ser descarada: evitar que uma dívida superior a R$ 4 bilhões seja assumida pelos bancos garantidores do financiamento das concessões. Mas o descaramento aumenta: ainda assim, o governo diz-se preocupado em não passar a imagem, mundo afora, de que a União estará socorrendo empresas que não cumprem seus contratados. No entanto, estará.

Com a devida vênia, se as concessionárias não estou cumprindo a concessão e não realizando as obras previstas ou não têm garantidos os empréstimos solicitados, problema delas. Devem ser responsabilizadas e punidas por isso. Jamais beneficiadas e ressarcidas.

Alegam as coitadinhas que o governo anterior, aquele da “presidenta” defenestrada, que lhes deu as concessões, prometeu empréstimos de 70% do investimento e com juros de pai para filho, e acabou não cumprindo a promessa. O BRDS justifica-se apontando a inviabilidade dos projetos apresentados e a mudança das condições econômicas das empresas após o leilão de concessão.

Coisa de louco! Quer dizer: ou eu não entendi nada direito ou tem alguém fora do prumo – para dizer o mínimo – em Brasília. De todo modo, recapitulemos outra vez: o governo não tem condições nem dinheiro para prestar o serviço público. Então, entrega essa prestação à iniciativa privada. Esta, por seu turno, solicita recursos ao governo concedente, que – repita-se – não podia exercer diretamente a atividade pública por não ter recursos para tanto. Mas concede-os à empresa concessionária privada. Recursos públicos. E se não o fizer, corre o risco de sofrer as consequências disso…

Daí, o diligente ministro Moreira Franco decidiu que eventuais investimentos já feitos pelas antigas concessionárias – e que abandonaram a concessão no meio do caminho – serão indenizados pelas novas concessionárias. Em tais condições – para homenagear o presidente Michel, chefe de Moreira e amante das mesóclises –, indaga-se: encontrá-las-á?

E eu que tinha ojeriza às concessões, passei a odiá-las.

Ah, meu Brasil!…

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Uma ideia sobre “Concessões à brasileira

  1. Zé Povinho

    Saiu uma infeliz e entrou no lugar dela outro, mas este é mais fino do que aquela, não atropela o português de forma arrogante, mas está nos enfiando no buraco como fazia a infeliz. Esta de transferir para “investidores” serviços públicos e financiá-los porque não tem capacidade financeira para tocar os negócios é mesmo de matar. Mas Pindorama é pródiga neste tipo de coisas, entregamos de bandeja as coisas e ainda financiamos os recebedores, até quando perdurará tal estado de coisas?

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