7:10A tragédia de 13 de dezembro

por Célio Heitor Guimarães

O espaço da coluna de hoje deveria ser ocupado por uma faixa preta, de cima a baixo, sem legenda ou palavras, já que a data assinala a passagem dos 50 anos de um dos mais trágicos momentos da vida nacional. Considerado por Zuenir Ventura “um golpe dentro do golpe”, o Ato Institucional nº 5, o famigerado AI-5, foi promulgado pelo Conselho de Segurança Nacional (CSN) em 13 de dezembro de 1968, institucionalizando a ditadura militar no Brasil e fazendo baixar as trevas sobre a nação. O Congresso Nacional foi fechado, o habeas-corpus foi banido do mundo jurídico, muitas prisões foram realizadas, mais de mil cidadãos tiveram os seus direitos políticos cassados, filmes, peças de teatro, livros, programas de rádio e de TV, jornais e letras musicais foram censurados, podados ou simplesmente proibidos.

Ilegítimo e sem o apoio popular, o governo do ditador Arthur da Costa e Silva estava em pânico no curso de 1968. Passou a ver “contrarrevolucionários” em todos os cantos e frestas. E, pressionado pelo núcleo duro fardado, apertou o torniquete às liberdades de expressão e aos direitos humanos como nunca se fizera na história do Brasil.

A célebre reunião de 13.12.68, hoje até pode parecer folclórica (ou lembrar uma peça do tropicalismo, dirigida por José Carlos Martinez Corrêa, como frisa Zuenir), porque marcada pela presença de um bando de homens de siso enfarruscado, que se diziam preocupados com o futuro do país, mas que, na verdade, estavam muito pouco informados sobre a realidade nacional, não sabiam bem o que queriam e não tinham a necessária noção das consequências do que estavam prestes a fazer. O único que demonstrava alguma lucidez era o então vice-presidente da República Pedro Aleixo. Foi a única voz contrária ao terror, mas tinha um problema – era um civil – e foi logo arredado das negociações.

Jarbas Passarinho, então ministro do Trabalho, fingiu repugnar-se com o caminho da ditadura, mas votou a favor, mandando “às favas todos os escrúpulos de consciência”. E aí todos os presentes, menos um, estatuíram no país o reinado do terror e da tortura. Entre os presentes – é sempre bom lembrar – havia um paranaense: o então ministro da Agricultura Ivo Arzua.

Para citar, mais uma vez, o jornalista, escritor e autor do clássico “1968 – O Ano que Não Terminou” Zuenir Ventura, na bela resenha feita para a revista Veja: “Além de efetuar o expurgo nas obras de criação, o AI-5, em dez anos, puniu 1.607 cidadãos, dos quais foram cassados 321: seis senadores, 110 deputados federais e 161 estaduais, 22 prefeitos, 22 vereadores – mais de 6 milhões de votos anulados. (…) Entre os funcionários públicos punidos por delito de opinião estavam três ministros do Supremo Tribunal Federal – Hermes Lima, Evandro Lins e Silva E Vitor Nunes Leão – e professores universitários como Caio Prado Júnior (condenado a quatro anos e meio de prisão por uma entrevista a um jornal estudantil), Florestan Fernandes, Fernando Henrique Cardoso e muitos outros”.

O ex-presidente Juscelino Kubitschek e o ex-governador Carlos Lacerda, de posições políticas diametralmente opostas, foram os primeiros a serem presos. JK, então com 66 anos, nas escadarias do Teatro Municipal por um grupo de oficiais do Exército, e Lacerda, um dia depois, quando foi ao Regimento Caetano de Faria, protestar contra a prisão do ex-presidente.

Dito isso, nada mais direi. O silêncio do espaço que me restaria é dedicado à memória daqueles que perderam a vida por obra e graça do maldito AI-5, a começar pelo estudante Edson Luís.

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2 ideias sobre “A tragédia de 13 de dezembro

  1. SERGIO SILVESTRE

    Pois é,vivemos um regime “positivo operante”nem nos bons tempos em que servi em Brasilia,quando o presidente era o Médici não se respirava tanta ditadura.Naquele tempo os presidentes militares ao menos eram inteligentes,o que temos hoje é um bando de lunáticos,corruptos,com uma vontade danada de cometer algo contundente ,mesmo que isso nos custe uma grande sova no poderio militar com a Venezuela.
    Eles podem até estar passando necessidades de abastecimento,mas tem munição a vontade,enquanto nosso exercito quase nu ,não aguenta meia hora de fogo deles.

  2. Parreiras Rodrigues

    É. Mas os milicos todos tinham medo de mim. Explico: Era presidente da União dos Estudantes Secundários de Santa Isabel do Ivai, a USIES. Quando mataram o Edson Luiz, no Calabouço, RJ, distribui nota de repúdio ao ato de violência. Vinte linhas mimeografadas. Existia o mimeógrafo – lembram-se? O ato foi fichado no SNI, no DOPS – Serviço Nacional de Informações e Departamento de Ordem Política e Social. Seria a glória: MANIFESTO DE ESTUDANTE LÁ DAS BARRANCAS DO PARANAZÃO DERRUBA DITADURA!

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