6:33Réquiem para Albert Uderzo

Albert Uderzo

Albert Uderzo, criador de Asterix. Foto de Stephane de Sakutin/AFP

por Célio Heitor Guimarães

O mundo dos quadrinhos e os fãs da arte quadrinizada perderam, na terça-feira 23/03, um de seus mais destacados ícones. O desenhista e criador Albert Uderzo, um dos pais de Asterix, Obelix e de toda a valente e animada turma da península de Armórica, faleceu aos 92 anos, vítima de um ataque cardíaco. Estava em casa, em Neully-sur-Siene, França, cercado por familiares.

Quem gosta (ou já gostou) de gibis de fina qualidade, sabe de quem eu estou falando. Asterix sempre foi um dos meus heróis favoritos. Baixinho, bigodudo, envergando um capacete alado na cabeça, cujas asas se alteram com o humor do dono, tem como companheiro inseparável um gorducho, bom de briga e louco por um javali assado. Asterix e Obelix são criações imortais de René Goscinny e Albert Uderzo.

A ação se passa no ano 50 antes de Cristo. O poderoso Império Romano domina o mundo, inclusive a Gália, que na época compreendia a França, a Bélgica e a Itália… Quer dizer, toda a Gália, menos uma aldeia, situada na península na Armórica e habitada por gauleses que resistem bravamente aos invasores. A tribo é chefiada pelo majestoso Abracurcix, cujo único temor é que o céu caia em sua cabeça. Mas a resistência é liderada por Asterix e Obelix, graças à poção mágica preparada pelo venerável druida da aldeia, Panoramix. (Nota: Obelix está proibido de tomar a poção, pois caiu dentro do caldeirão do líquido quando bebê e adquiriu super-força permanente.) Ao redor, as guarnições de legionários romanos de Babaorum, Aquarium, Laudanum e Petibonum amargavam derrotas sobre derrotas para desespero de César.

Albert Aleandro Uderzo nasceu em 25 de abril de 1927, em Fismes. Tinha seis dedos em cada mão e precisou passar por cirurgia para corrigir o problema. Era também daltônico e não distinguia o verde do vermelho. Nem por isso deixou de ser o artista que foi.

Publicou o seu primeiro desenho, em 1941, uma sátira de O Corvo e a Raposa, das Fábulas de Esopo, no suplemento Boum, do semanário Junior.

No mesmo ano, para fugir do Serviço de Trabalho Obrigatório – durante a ocupação da França pelos nazistas – Uderso se refugiou em Les Villages, na região de Côtes-du-Nord, na Bretanha francesa. Com a libertação da França, muniu-se de um acordeão, juntou-se a dois músicos italianos e passou a tocar em festas e eventos para sobreviver.

Depois da guerra, voltou-se inteiramente para a arte, criando diversos personagens e pequenas histórias, publicadas entre 1946 e 1947, no jornal La Démocratie, da cidade de Toulouse.

A parceria com com René Gosciny iniciou em 1951 e durou 26 anos. Juntos, inicialmente, criaram “Jehan Pistolet” e “Benjamin et Benjamine” (1052), “Luc Junior” (1954) e “Oumpah Pah” (no “Brasil, Umpa-Pé”), em 1958.

Asterix surgiu em 1959. A primeira aventura foi publicada, em capítulos, na revista francesa Pilote, de 29 de outubro de 1959. O sucesso foi total e, desde então, o pequeno herói e seus companheiros protagonizaram uma das mais populares “bandas desenhadas” de todos os tempos, com mais de 370 milhões exemplares, em 111 idiomas. O primeiro álbum foi lançado em 1961 e a série encontra-se atualmente no nº 38 e já teve mais de 370 milhões de exemplares vendidos no mundo. Rendeu também filmes, desenhos animados e um parque temático, perto de Paris, com cerca de dois milhões de visitantes por ano.

Em março de 1977, durante a produção do álbum “Asterix entre os Belgas”, Goscinny rompeu o contrato com a editora Dargaud, ao descobrir que ele e Uderzo estavam sendo lesados pelos editores. Foi um processo conturbado.

Meses depois, em 5 de novembro, René sofreu uma crise cardíaca na bicicleta ergométrica de seu médico e veio da falecer.

Uderzo foi obrigado pela editora a completar o álbum, sob pena de ter que pagar dez milhões de francos. E assumiu também, dali em diante, o argumento das histórias.

Em 2011, aos 84 anos de idade, depois de 52 anos de ininterrupta atividade, decidiu aposentar-se, mas continuou supervisionando as aventuras. Em 2013, com o álbum nº 35 – “Asterix entre os Pictos” –, o personagem foi entregue a Jean-Yves Ferri (texto) e Didier Conrad (desenhos), que surpreendentemente mantiveram o estilo e a qualidade original de Goscinny e Uderzo.

Ainda assim, Uderzo confessou ao jornal Le Parisien, no final de 2018, que “entregar Asterix me dilacerou um pouco”.

No Brasil, Asterix chegou na década de 70, sendo publicado pelas editoras Bruguera, Cedibra, RGE, Salvat e Record, sempre em álbuns com tradução caprichada e impressão colorida primorosa.

No entanto, depois de “O Papiro de César”, datado de 2015, Asterix e Obelix sumiram das livrarias brasileiras. O álbum 37 deveria ser “Asterix e a Transitálica” (“Astérix et la Transitalique”, no original), mas não deu as caras por aqui. É que a Editora Record, editora no Brasil do gaulês desde 1983, perdera os direitos de publicação da série.

Há notícia de que a Panini Comics – que já publica, entre outros, os heróis da DC Comics, e da Marvel – deverá ser a nova editora dos álbuns de Asterix.

Albert Uderzo era casado com Ada Milani e pai de uma filha, Sylvie.

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