7:46O monumento do Deltan

Da Folha de S.Paulo e The Intercept Brasil

Deltan idealizou monumento à Lava Jato, mas Moro previu crítica à ‘soberba’

Mensagens apontam que, por estratégia de marketing, procurador articulou ‘marco visual’ em Curitiba

“Precisamos de estratégias de marketing. Marketing das reformas necessárias”, disse o procurador Deltan Dallagnol em grupo de conversa com colegas em maio de 2016.

Dessa necessidade, mostram mensagens obtidas pelo site The Intercept Brasil e analisadas pela Folha, surgiu a ideia de fazer uma espécie de monumento à Lava Jato e a reformas em Curitiba, escolhido por meio de concurso.

O projeto nunca foi concretizado, mas rendeu discussões entre procuradores, com a chefia do Ministério Público Federal no Paraná e até com o então juiz Sergio Moro.

A colegas, no aplicativo Telegram, Deltan demonstrava entusiasmo com o projeto. O plano era realizar um concurso de uma escultura que simbolizasse a operação e mudanças defendidas pelos procuradores, como o projeto das Dez Medidas, que estava em tramitação no Congresso, e a reforma política.

“A minha primeira ideia é esta: Algo como dois pilares derrubados e um de pé, que deveriam sustentar uma base do país que está inclinada, derrubada. O pilar de pé simbolizando as instituições da justiça. Os dois derrubados simbolizando sistema político e sistema de justiça…”

O plano foi levado pelo procurador, que é chefe da força-tarefa, a Moro. Deltan esperava obter apoio do magistrado para colocar a peça na praça em frente à sede da Justiça Federal, que já virara local de atos em apoio à Lava Jato.

Citou a possibilidade de um concurso de escultura “que simbolize o fato de que a lava-jato é um avanço, mas precisamos avançar com reformas, como a reforma do sistema de justiça e do sistema político”.

“Isso virará marco na cidade, ponto turístico, pano de fundo de reportagens e ajudará todos a lembrar que é preciso ir além… Posso contar com seu apoio?”, questionou.

Moro, em conversa no aplicativo, transpareceu contrariedade: “Não é melhor esperar acabar?”

Deltan negou que o propósito fosse “endeusar” a operação e insistiu: “Eu apostaria que tão somente a existência do concurso já será matéria de jornal, estimulará o debate sobre reformas, e frisaremos na proposta do concurso das esculturas a necessidade de reformas e que elas simbolizem as reformas necessárias… sabemos que precisamos ir além, como país, e só estou pensando nisso para fazer tudo o que estiver ao meu/nosso alcance.”

Segundo o chefe da força-tarefa, “A Paula mesmo adorou e se empolgou”, em referência à procuradora-chefe no Paraná, Paula Conti Thá. Ele argumentou que o plano não seria da equipe da Lava Jato, mas da Procuradoria no Paraná com a Justiça Federal.

Depois de pedir um prazo para pensar, Moro deu opinião contrária: “Melhor deixar para depois. Em tempos de crise, o gasto seria questionado e poderia a iniciativa toda soar como soberba”.

Para o então juiz, iniciativas que soam como homenagens “devem vir de terceiros”.

Deltan disse na conversa por meio do aplicativo que não haveria gastos dos cofres públicos e que o “candidato faria com patrocínio privado”.

Procurado, o Ministério Público Federal no Paraná disse que, em uma força-tarefa, “diversas vezes iniciativas são cogitadas por seus integrantes ou por terceiros, sendo que muitas não se concretizam após reflexão e ponderações, pelas mais variadas razões”.

O Ministério Público afirmou ainda que os integrantes da equipe “têm reiteradamente defendido que, para além da Lava Jato, haja reformas nas leis para reduzir a corrupção e a impunidade”.

Os procuradores, por meio da assessoria, voltaram a afirmar que “não reconhece as mensagens que lhe têm sido atribuídas”. “O material é oriundo de crime cibernético e sujeito a distorções, manipulações e descontextualizações.”

Mensagens divulgadas anteriormente pelo Intercept e pelo jornalista Reinaldo Azevedo mostraram o chefe da força-tarefa pedindo, também em 2016, apoio financeiro da 13ª Vara Federal para a produção de um vídeo em apoio às Dez Medidas que seria veiculado na TV. Moro, segundo o diálogo, deixou a possibilidade em aberto e disse que responderia mais adiante.

O vídeo com o roteiro descrito por Deltan de fato foi produzido, mas o Ministério Público Federal afirma que nunca houve direcionamento de recursos da Vara Federal para a campanha das Dez Medidas.

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2 ideias sobre “O monumento do Deltan

  1. Franco

    Moro sempre inteligente, mesmo em mensagens possivelmente adulteradas e editadas (quem sabe né, afinal o gringo não mostra os originais com medo de ser preso).

    Aliás, essas supostas conversas terão valor legal?
    Se tiverem (pela via avessa da interpretação política do STF), será que eventuais conversas de Toffoli e Gilmar, gravadas clandestinamente, valerão também? Vão instituir o vale tudo? Tem certeza?

  2. Oto Lindenbrock Neto

    As mensagens estão com a PF. É fácil verificar se são verdadeiras ou não. Basta Dallagnol entregar o celular e o computador. As mensagens podem não ter valor legal para condenar. Mas dizem muito sobre os limites que foram ultrapassados. E antes que digam que isso é defender bandidos vou citar apenas um caso – aliás admitido pelo próprio Deltan – que mostra os padrões éticos do próprio. Às vésperas da última eleição, Deltan participou de um evento secreto, promovido pela XP investimentos, para banqueiros brasileiros e estrangeiros. O tema era “Lava Jato e as eleições”. Imagine se algo semelhante acontecesse nos EUA? Deltan puxaria no minimo 30 anos usando uniforme laranja. Um procurador da República, que detém informações privilegiadas de operações que podem alterar os rumos de uma eleição, mostra o caminho para investidores…pode isso Arnaldo?

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