por Thea Tavares
Um advogado que conheço costuma dizer que não pega caso de divórcio antes do inverno. O frio é fatal e costuma espantar as tentativas de separação. Se pegar a ação, ele aconselha aos colegas que fiquem bem cientes da possibilidade dela ser frustrada ou empurrada com a barriga literalmente até a volta do calor. A natureza é implacável! Mesmo que os motivos da desavença não desapareçam por completo, pesam mais sobre os ânimos a saudade de se dormir de conchinha e os pés gelados nessa época. O frio congela até o raciocínio e você esquece que as duas situações poderiam ser resolvidas rapidamente com um travesseiro de 90 cm e um par de meias de lã, este último é encontrado com facilidade na feira livre mais perto de você.
Sabendo disso, fico pensando se não foi proposital inventarem o Dia dos Namorados no Brasil às portas do início oficial do inverno. Mas isso só faz algum sentido para a parte do mapa que tem clima subtropical. No máximo, alcança também as regiões mais altas do sudeste brasileiro. Para a região Sul, essa lógica funciona! No Hemisfério Norte, Europa e Estados Unidos comemoram em 14 de fevereiro o seu “Valentine’s Day”, portanto, em pleno inverno, com todos os seus edredons, vinhos e lareiras.
Aqui, o Dia dos Namorados acontece na véspera do dia de Santo Antônio, o tal santo casamenteiro (13 de junho). Serve para quem amargou a solidão no dia anterior – e botou olho gordo nos diversos espetáculos promovidos pelos casais para celebrarem sua união – também poderem aprontar peripécias em nome de alcançarem o milagre do desencalhe. Nem que seja pagando o mico de caçar em praça pública uma estatueta do santo dentro de um bolo quilométrico, com direito ao bônus de ver sua foto de felizardo ou felizarda desesperados no jornalzinho da cidade, da igreja, da prefeitura, com a boca toda lambuzada de merengue. Pensa se alguém reza pra esse mesmo santo ao longo do ano ou se ao menos conhece a história e os fatos da vida do religioso que motivaram a sua santidade? Nada! O lance é o bolo. Porque, apesar da questão mística ou de todos os apelos meigos e românticos que cercam a data, o que vale mesmo nessa hora do vamos ver é a convicção de conseguir a glória de atualizar o antivírus, ficar em dia com os prazeres mundanos, uma vez que “não existe pecado do lado debaixo do Equador”.
A vida do encalhado ou da encalhada nessa época é pra lá de triste. Mal passou o dia das mães (se não tiver mais a progenitora por perto, a dor da perda só continua avançando no calendário) e o comércio, a televisão, o mobiliário urbano já vêm com uma avalanche abusiva e apelativa do modo de vida “felizes para sempre”. Não dá pra ver vitrine de loja nessa época. A TV a cabo monta seus pacotes “água com açúcar” e as rádios capricham no repertório “mela-cueca”. Até os veículos em plataforma digital e serviços de streaming reproduzem a fórmula consumista. Saturação total!
Mas não vale ir atrás de companhia só em função das pressões da data ou para ganhar presente no dia 12. Esse crime não compensa! Porque as flores murcham, o chocolate engorda, dá celulite, espinha, dá alergia. Vale só pela pegação, sempre vale. Se a investida for apenas para galinhagem, sem compromisso, sem grandes expectativas, é super válida, saudável, leve e coloca sorrisos na nossa cara. #VaiQue… No máximo, dá sapinho.
O importante é a pessoa se amar em primeiro lugar. É isso o que traz segurança para enfrentar afetos e desafetos em qualquer época do ano e a todo momento. Mas se você passar em branco e não rolar nada espontaneamente, se apoie no consolo do desfecho do conto de fadas da Bela Adormecida na versão “Malévola”, dos estúdios Disney. O amor verdadeiro não é o do Princípe Encantado. O nome mesmo já diz: está encantado. As chances de você acabar num brejo, beijando um sapo ou uma sapa, são de, no mínimo, 50%. Se isso acontecer e o arrependimento surgir depois, é bom se lembrar dos conselhos daquele advogado que eu conheço: espera o inverno passar e bota a fila pra andar nos primeiros raios do calor do verão. Amargura é perda de tempo e dá gastrite!