de Oberlan Rossetim
A tarde está úmida e esquiva. Parece que não queria estar no calendário. Início de outono. Começo de lágrima.
O céu usa maquilagem no rosto, cinza. Talvez esteja sofrendo com lembranças. Ou será que os abismos, como eu, andam insones?
Sinto-me quebradiço: corro sérios riscos de deixar de pensar em você a qualquer momento.
Acabei de passar pano no chão da sala em que guardo o que nunca mais vi. O passado riu-se de mim à beça! Na cera do piso escorrego toda vez que meus lábios são obrigados a esquecer de que são sensíveis.
A sala fica muito longe da tarde. Meu teto é o dia. Minha casa não mais me abriga.
Moro e morro nas esquinas dela.
Quando os meus olhares de chama extinta – o adeus – se quebrarem, a saudade espalhar-se-á pelos meus dedos e não encontrará o anel de desejo puro e maciço para se esconder.
Tudo o que era belo de repente ficou impossível. O café esfriou. A mesa é pouca. Nela não cabem vasos de flores.
As mágoas estavam mornas, sem vontade. Agora elas têm pressa. Fico sem poder controlar meus passos.
A carta que lhe escrevi você nem olhou. Sobre o balcão amarelou, junto aos ossos dos cigarros.
Procuro no pouso das borboletas a última palavra que você me disse. Nenhuma boca jamais poderá ser a ponte entre os meus cortes e os curativos do seu tom de voz.