12:33Nas esquinas da sala

de Oberlan Rossetim

A tarde está úmida e esquiva. Parece que não queria estar no calendário. Início de outono. Começo de lágrima. 

O céu usa maquilagem no rosto, cinza. Talvez esteja sofrendo com lembranças. Ou será que os abismos, como eu, andam insones?

Sinto-me quebradiço: corro sérios riscos de deixar de pensar em você a qualquer momento.

Acabei de passar pano no chão da sala em que guardo o que nunca mais vi. O passado riu-se de mim à beça! Na cera do piso escorrego toda vez que meus lábios são obrigados a esquecer de que são sensíveis.

A sala fica muito longe da tarde. Meu teto é o dia. Minha casa não mais me abriga.

Moro e morro nas esquinas dela.

Quando os meus olhares de chama extinta – o adeus – se quebrarem, a saudade espalhar-se-á pelos meus dedos e não encontrará o anel de desejo puro e maciço para se esconder.

Tudo o que era belo de repente ficou impossível. O café esfriou. A mesa é pouca. Nela não cabem vasos de flores.

As mágoas estavam mornas, sem vontade. Agora elas têm pressa. Fico sem poder controlar meus passos.

A carta que lhe escrevi você nem olhou. Sobre o balcão amarelou, junto aos ossos dos cigarros.

Procuro no pouso das borboletas a última palavra que você me disse. Nenhuma boca jamais poderá ser a ponte entre os meus cortes e os curativos do seu tom de voz.

Estou com fome, penso. E isso fecha a lamentação.
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