7:51Medo

por Demétrio Magnoli

Bolsonaro fomentou protestos de rua porque teme governar na democracia

“Aqui tem olavetes, intervencionistas, católicos e templários”, explicou uma certa Elizabeth Rezende, que está entre os organizadores das manifestações deste domingo (26) mas esqueceu-se de elencar os trilobitas, os entoproctos, os braquiópodes, os caminhoneiros e os reptilianos.

“Aqui”, contudo, não tem Bolsonaro. O líder inconteste, “Mito” e “Messias”, traiu a fauna paleozoica de seus devotos. O porta-mentira oficial, general Rêgo Barros, precisou ler uma nota que qualifica os eventos como “espontâneos”. De fato, a mobilização foi incitada (com “c”, viu Weintraub?) pelas redes do clã presidencial, mas o capitão recuou para a retaguarda, abandonando seus soldados na trincheira enlameada.

Medo. A incitação e a fuga têm motivo idêntico. Mais: o medo é a melhor chave explicativa do comportamento geral do presidente da República.

Na política, o medo está sempre presente. FHC temia, mais que tudo, o retorno do monstro inflacionário. Daí, a sobrevalorização do real, seu único grave erro de política macroeconômica. Antes de surfar a onda ascendente do ciclo global, Lula temia a ruptura da estabilidadeeconômica herdada. Daí, o acerto decisivo na escalação da equipe econômica de seu primeiro mandato. Os medos de FHC e Lula referenciavam-se, principalmente, no interesse nacional. O medo de Bolsonaro, pelo contrário, referencia-se exclusivamente no interesse pessoal. Ele fomentou a mobilização de rua porque teme governar na democracia e desertou, assustado, porque teme o impeachment.

O medo é a sombra inseparável de Bolsonaro. Cabe ao psicanalista investigar a dimensão íntima de seu medo, que se manifesta na conjunção da homofobia com a obsessão pelo cano de uma arma. Já a ciência política deve iluminar seu temor de exercer o cargo de chefe de Estado.

Nos idos da minha infância, as crianças ainda brincavam na rua. Lembro de um garoto ruivo, provocador, geralmente ignorado pelos demais, que corria para o refúgio de sua casa quando algum de nós reagia a suas afrontas. Durante 28 anos, Bolsonaro habituou-se a praticar o esporte do insulto e da difamação, abrigando-se na barra da saia da imunidade parlamentar. A fortuita ascensão ao Planalto privou-o da redoma protetora. Fora do santuário, exposto às sanções da democracia, ele experimenta o peso insuportável de sua inadequação. Estamos, todos, condenados a participar da aventura do valentão de opereta cindido entre seus dois medos.

Originalmente, as manifestações foram convocadas sob as bandeiras do fechamento do STF e do Congresso. “Essa pauta está mais para Maduro”, esclareceu Bolsonaro, finalmente. Mas, mesmo após a operação sanitizadora, a presença do presidente nas ruas o implicaria em atentado contra as instituições, um crime de responsabilidade bem mais sério que as pedaladas fiscais dilmistas.

Cedendo ao medo do impeachment, Bolsonaro ganha a chance de viver mais um dia no Planalto. O problema é que essa perspectiva o aterroriza: no poder, o gesto adolescente da arminha não substitui o imperativo de entregar resultados seguindo as regras da democracia.

A saída é ceder ao medo de governar, utilizando o pretexto clássico da facada nas costas. “Dolchstosslegende”: o mito nasceu na Alemanha, na esteira da derrota na Primeira Guerra Mundial, como fonte da narrativa da extrema direita. A Alemanha, diziam, teria vencido a guerra se o Exército não tivesse sofrido a traição doméstica dos políticos de esquerda, da imprensa esquerdista e dos diabólicos judeus.

O discurso bolsonaro-olavista segue trilha paralela, invocando as facadas nas costas desferidas pelo Congresso, pelo STF e pela imprensa “comunista” (Folha, Globo) como justificativa antecipada do eventual fracasso do governo.

Dessa vez, Bolsonaro recuou diante do medo do impeachment. Na próxima, movido pelo medo de governar, avançará até o abismo?

*Publicado na Folha de S.Paulo

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4 ideias sobre “Medo

  1. Jose

    A canalhice aparece de cara ao omitir erros de lula já no primeiro mandato, a começar pelo mensalão. E sequer passa perto dos erros econômicos cometidos no segundo mandato de lula, por exemplo a explosão da dívida pública.
    Omite também a catástrofe que foi o governo dilma e escancara a vigarice ao tentar comparar o Brasil atual com a Alemanha do período entre guerras.
    Quanto a manifestações de rua, a mesma coisa, o petismo também achou e acha que tem força, vide as “convocações” para manifestações em 2012, 2013…
    Bolsonaro é fraco, é a pura verdade. Mas estamos muito longe da Alemanha dos anos 20.

  2. SERGIO SILVESTRE

    O “jumento” de Brasilia não quer reforma nenhuma,por que ele sabe que nem com a reforma da previdência ele vai dar jeito,é um sujeito oco,não serve pra nada ,nem ele nem seus seguidores milicianos e outros tantos de imbecis que nele acreditam e até lavam a camiseta num dia para colocar no outro.
    Isso é como a seguidora de um Edir ou Malafaia que vende a TV para dar o dinheiro para esses malandros.
    Me parece que o pensamento muar do “jumento” de Brasilia é a bagunça,ele quer curtir os poucos dias na presidência fazendo o que sempre fez,nada,e disparar sua verborragia para todos os lados,e torce para que o Moro e o Guedes peçam o boné para o caos se instalar de vez no Brasil.
    Ele não tem compromisso com ninguém,57 milhões de incautos votou nele sem saber de alguma proposta,foi afastado por uma suposta facada para não ser mostrado o que ele é realmente fora de um Twiter,agora quando as latas da despensa começam a esvaziar,tem bozolista a beira de um ataque de nervos,alguns ainda tentam explicar o inexplicável
    .

  3. Toti Colaço

    Sérgio…então 57 milhões são jumentos e vc é espertão né…sei…sei…seu imbecil !!

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