6:34Villas Bôas em cena é aviso contundente para rede bolsonarista

por Marcelo Godoy 

No dia 25 de abril, diante dos ataques bolsonaristas ao vice-presidente, Hamilton Mourão, o general Paulo Chagas fez um desabafo, chamando Olavo de Carvalho de “Rasputin”. “Assim como o Rasputin foi um dos grandes responsáveis pela queda do Czar, na Rússia, esse cidadão só atrapalha, age como o monge russo.”

No dia 26, o Clube Militar – que Mourão presidia quando se tornou candidato a vice – publicou o artigo Desagravo e Alerta, do coronel Sérgio Paulo Muniz Costa. “Desagravo também aos militares, atingidos pela incontinência verbal que, impune, prospera inexplicavelmente em distintas esferas de poder e de influência no País, buscando, pela intimidação e coação, impor ideias e teses radicais que não se coadunam, em absoluto, com a índole da população brasileira.”

O artigo do coronel ocupou durante dez dias espaço nobre no site do Clube Militar. Ele prossegue: “E desagravo à República, equivocadamente tida por vulnerável ao assalto de aventureiros ignorantes mancomunados em uma nova internacional extremista.” O alerta não se dirigia mais a Olavo, mas também ao The Movement, o grupo populista de direita criado por Steve Bannon, do qual o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) é o representante no País.

O coronel concluiu: “É inadmissível que expoentes dessa linha exótica de pensamento, independentemente de onde estejam, continuem a exibir suas preferências ideológicas sem serem reprovados pela sociedade brasileira, usando saudações fascistas na conclusão de seus discursos ou citando em suas análises desmioladas Carl Schmitt, o teórico constitucional que se colocou a serviço do Terceiro Reich. Por quem tomam os brasileiros? Por covardes? Por ignorantes?” Em sua posse, o chanceler Ernesto Araújo – indicado por Olavo – usou a saudação anuê, a mesma dos integralistas nos anos 1930.

Na sexta-feira, foi a vez do coronel da Aeronáutica Lucio Wandeck, no jornal Inconfidência, atacar Olavo de Carvalho. Especialista em contrainteligência, Wandeck é – a exemplo do general Chagas – bolsonarista de primeira hora. É ainda dos raros militares que defendem não só o presidente, mas também seus filhos. Mas não poupa Olavo. “Ele está sempre em busca de palanque.”

Desagravos, alertas e desabafos de nada adiantaram. Nada deteve a rede bolsonarista da internet em seus ataques contra os militares. No fim de semana, o alvo foi o ministro da secretaria de Governo, general Santos Cruz, que detém a chave do cofre das verbas publicitárias e é conhecido pela inflexibilidade. “Quando ele ri, nós pensamos que ele está chorando”, disse um general da ativa. Uma entrevista de Santos Cruz de um mês atrás serviu de pretexto para os ataques compartilhados por Jair Bolsonaro. O desconforto atingiu até o general Augusto Heleno, que está cansado de tantas confusões no governo.

Mais uma vez a confusão tinha Olavo de Carvalho na cena. “É preciso verificar a serviço de quem está esse homem”, disse, no domingo, um general da turma de 1972 da Academia das Agulhas Negras. Na segunda-feira, foi a vez do ex-comandante do Exército, o general Eduardo Villas Bôas – aquele que Jair Bolsonaro disse ser um dos responsáveis por ele estar na Presidência – reagir ao morador da Virgínia e interpretar o pensamento da maioria dos militares.

A entrada de Villas Bôas em cena é o maior dos avisos que a rede bolsonarista podia receber. O general criou outro apodo para Olavo: “Trótski de direita” e afirmou que o guru dos Bolsonaros “não compreende que, substituindo uma ideologia pela outra, não contribui para a elaboração de uma base de pensamento que promova soluções concretas para os problemas brasileiros”.  “Age (Olavo) no sentido de acentuar as divergências nacionais no momento em que a sociedade brasileira necessidade recuperar a coesão”.

Mas os expoentes da rede bolsonarista não se detiveram nem mesmo diante da figura de Villas Bôas. Leandro Ruschel escreveu: “O projeto de país a ser seguido é aquele que venceu nas urnas ou o que os senhores generais querem?”. Bernardo Küster afirmou: “Você só atesta que as Forças Armadas ainda mantém o mesmo isentismo (sic) pueril que permitiu a acensão (sic) de toda a esquerda”.

A ação de Villas Bôas foi um voo solo? No passado, quando comandava a Força, Villas Bôas tuitava para o público externo a fim de pacificar o público interno. Quem Villas Bôas quer agora pacificar? Se não há uma ala militar no governo – como os generais do Executivo se esforçam em dizer – por que Villas Bôas se manifestou contra o guru?

O ex-comandante pôs sua autoridade na balança. Em entrevista ao Estado, reiterou as críticas a Olavo. Disse que ele presta um “desserviço” ao País.  No passado, era a voz de seus subordinados; agora, ao se solidarizar com Santos Cruz, tornou-se a voz dos generais do Planalto cansados do destempero de uns e das confusões de outros que enredam o governo em intrigas palacianas sem fim. Ao defender o Exército, Villas Bôas não o fez por esprit de corps. Quis pacificar o Palácio.

E o Exército nesse episódio? O Alto Comando esteve reunido ontem e manteve sua avaliação de que a instituição não deve polemizar com Olavo – e com o governo. O Exército pretende reafirmar seu papel histórico, a começar pela lembrança de que neste 7 de maio, há 139 anos, morria seu patrono, o Duque de Caxias. A Força quer recordar a figura do Pacificador. E, depois, comemorar o Dia da Vitória na Europa, o dia em que “a cobra fumou”. E, assim, o Alto Comando, apesar de se manter afastado do Twitter, também manda seus recados.

*Publicado no jornal O Estado de São Paulo

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