20:08ZÉ DA SILVA

O cedro está ali, silencioso, na calçada da avenida. Ninguém vê. Nem eu, que passava a pé ao lado dele. A concorrência é forte. Está ao lado de uma loja de automóveis importados. Na placa, um Jaguar pula e parece querer enfiar as garras das quatro patas no tronco cuja casca é toda rachada. Parei, olhei para aquele deus e dei um abraço. Naquela hora o trânsito já estava congestionado. Nos carros parados, todos olhavam. Para os carros da concessionária, lanternas ligadas e dizendo para todos os motoristas que nenhum tinha bala na agulha para comprá-los. Beijei a árvore e fotografei seus galhos e folhas. Uma mulher passou ao lado e fez o sinal da cruz. Essa descoberta salvou o meu dia. Porque tinha deixado meu carro velho quietinho – e resolvido andar um pouco. Calculei, sem base alguma, o tempo de vida da minha paixão de fim de tarde – e como deveria ser ela no tempo em que só havia uma estradinha de terra ao lado. Sim, deveria ter toda uma família em volta. Todas ceifadas pelo progresso. Agora, sozinha, reina. Para mim, pelo menos.

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