21:52Raymond Chandler e O Longo Adeus

Trechos do livro “O Longo Adeus”, de Raymond Chandler, selecionados pelo jornalista Mauricio Dias, que acha o escritor “o maior autor de romances americano do século XX“, ressaltando uma possível exceção dada a William Faulkner.

Dito por um multimilionário sexagenário:

“- … Nós vivemos no que se chama de democracia, regida pela maioria do povo. Uma idéia ótima se chegasse a funcionar. O povo elege, mas são as máquinas partidárias que nomeiam, e as máquinas partidárias, para serem eficientes, precisam de muito dinheiro. Alguém precisa dar este dinheiro a eles e este alguém, seja um indivíduo, um grupo financeiro, um sindicato ou o que você quiser, espera alguma coisa em troca.” (…; pág. 252)

O mesmo multimilionário:

“- … Não se pode esperar qualidade de pessoas cujas vidas são uma sujeição à falta de qualidade. Não se pode ter qualidade com produção em massa. Não se deseja isso porque demoraria muito a chegar. Portanto, para substituir isso há o estilo. Que é um logro comercial com a intenção de produzir coisas obsoletas e artificiais. A produção de massa não poderia vender seus produtos no ano que vem a não ser que faça o que vendeu este ano ficar fora de moda. Temos as cozinhas mais brancas e os banheiros mais brilhantes do mundo. Mas na adorável cozinha branca a dona-de-casa americana média não consegue cozinhar uma refeição boa de se comer, e o adorável banheiro brilhante é sobretudo um receptáculo para desodorantes, laxativos, soníferos e produtos desta quadrilha de vigaristas que se chama indústria de cosméticos. Nós fazemos as embalagens mais bonitas do mundo, Sr. Marlowe. O que está lá dentro é, na maior parte, lixo.” (pág. 253)

Dito por um escritor de romances históricos best sellers:

“- … Uma vez tive um secretário homem. Despedi-o. Me incomodava ficando sentado por aí esperando eu criar alguma coisa. Cometi um erro. Devia tê-lo deixado ficar. Iam começar a dizer por aí que eu era homossexual. Os garotos inteligentes que escrevem resenhas de livros, porque não conseguem escrever mais nada, iam se encarregar de espalhar a notícia e minha carreira estaria feita. É preciso cuidar da carreira da gente, você sabe. São todos uns veados, todos eles. A bicha é o juiz artístico da nossa era, meu chapa. O pervertido é que está por cima agora.” (pág. 270)

Diálogo entre o mesmo escritor e Marlowe:

“- Sabe de uma coisa? Não passo de um mentiroso. Meus personagens têm quase dois metros de altura e minhas heroínas têm calos no bumbum de tanto deitar na cama com os joelhos pra cima. Laços e fitas, espadas e carruagens, elegância e gentileza, duelos e mortes galantes. Tudo mentira. Usavam perfume em vez de sabonete, os dentes delas apodreciam porque nunca os escovavam, as unhas eram negras da sujeira dos estábulos. A nobreza francesa mijava nas paredes dos corredores de mármores de Versalhes, e quando finalmente se conseguia tirar as várias roupas de baixo da adorável marquesa, a primeira coisa que a gente notava era que ela precisava tomar um banho. Deveria escrever assim.

– E por que não?

– Claro; e iria morar numa casa de cinco cômodos em Compton….se tivesse sorte.”

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