18:31ZÉ DA SILVA

Minha nóia não veio da pedra. Minha nóia veio do sangue. Eu vi escorrendo por baixo de uma porta e se espalhando no chão frio e branco. O que aconteceu do lado de lá? Alguém fez o clique e aquilo não era fruto daquela cena de 1900, do Bertolucci. Aquela. Criança sendo rodada no ar, pelos pés, até a cabeça ser destroçada nas quinas dos pilares. Eu tenho nóia. Vejo sangue principalmente na boca dos que tomam banho de perfume e têm camisa, gravata, ternos impecáveis. Os microfones e as câmeras drenam tudo e jogam na minha cara. Estou sentado. Não levanto mais. Sou um inválido por idade e falta de garra para sobreviver. Zé do Caixão no filme onde a sala é invadida pelo líquido grosso e vermelho. Ele, em preto e branco, anos atrás, me apavorando depois da meia-noite na tela da tv. Sozinho fiquei ouvindo: “À meia-noite encarnarei o seu cadáver!!” É meio-dia. Há campanha eleitoral. A pedra que conheço é a filosofal. Mas só de nome. Tenho nóia. Vou encarnar nos que se acham mais vivos.

Compartilhe

Deixe uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.