6:00Samba blim

por Ruy Castro

Se Orlandivo não tivesse existido, não sei se teriam acontecido Jorge Ben, Wilson Simonal, Elza Soares e Emilio Santiago na música popular. Em algum momento, eles viram em Orlandivo tudo que gostariam de ser: um cantor com poucos centímetros a mais de voz que João Gilberto, mas capaz de, com ela, balançar um salão inteiro, pondo 400 rapazes e moças para dançar ao som de suas letras movidas a onomatopeias – tuplec tuplin, blim blim blau, toff toff toff. Era o ritmo em pessoa, e esse ritmo era o samba, sua grande paixão.

O próprio Orlandivo continuava uma importante tradição do swing brasileiro: Mario Reis, Ciro Monteiro, Joel de Almeida, Dilermando Pinheiro, Jackson do Pandeiro e Miltinho. Mas só ele poderia ter composto “Samba Toff”, “Bolinha de Sabão” e “Tamanco no Samba” (“Samba Blim”). Ao lado do organista Ed Lincoln e do guitarrista Durval Ferreira, foi um dos pilares do sambalanço, sobre o qual Tárik de Souza acaba de lançar um livro magnífico, “Sambalanço – A Bossa que Dança” (Kuarup, 271 págs.).

Com o ocaso do gênero em fins dos anos 60, Orlandivo foi atirado à zona fantasma em que se exilaram muitos outros talentos pelos 30 anos seguintes – viva o Brasil. Em 2004, o cavaquinista Henrique Cazes o trouxe de volta para um vibrante CD, “Sambaflex”, e uma série de shows idem. A partir daí, a cantora Amanda Bravo passou a apresentá-lo por toda parte. Mas Orlandivo já sentia que era tarde. Deixou-nos na última quarta-feira (8), a meses de completar 80 anos.

Sua marca era o molho de chaves (sete, uma para cada nota) com que se acompanhava ao cantar. Certa vez, num show no Catete, catou no bolso e não achou suas chaves. Esquecera-as em casa.
Alguém na plateia – por acaso, eu – atirou-lhe um chaveiro, certamente desafinado. E, como sempre, Orlandivo arrasou.

*Publicado na Folha de S.Paulo

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